O Codex foi escrito a mão por um único escriba entre os séculos 8 e 9 e, em maio de 2023, passou a fazer parte do acervo do ANU – Museu do Povo Judeu, em Tel Aviv, Israel
O Codex Sassoon, provavelmente a cópia mais antiga e completa do Tanach1 – a obra sagrada fundamental do Judaísmo – foi vendido por 38 milhões de dólares em leilão pela Casa Sotheby’s, em Nova York, no dia 17 de maio de 2023. Um dos manuscritos mais caros já vendidos, o Codex passa a fazer parte do acervo do ANU – Museu do Povo Judeu, em Tel Aviv, Israel.
Embora os estudiosos estejam cientes da importância desse Codex desde o final da década de 1960, o mesmo permaneceu distante do público durante vários séculos
“Codex Sassoon” leva o nome de seu proprietário mais proeminente, David Solomon Sassoon (1880-1942). Nascido em Bagdá em 1880, ele era um apaixonado colecionador de manuscritos judaicos, cuja missão de vida foi construir uma extraordinária biblioteca de temas religiosos. O Codex Sassoon, que data do final do século 9 ou início do século 10, contém todos os 24 livros do Tanach – faltando apenas 12 páginas – e inclui vogais e sinais de cantilação (teamim, em hebraico), que indicam como ler os textos com a intonação adequada.
Embora os estudiosos estejam cientes da importância desse Codex desde o final da década de 1960, o mesmo permaneceu distante do público durante séculos. Uma turnê mundial levou o magnífico manuscrito de volta ao público neste ano de 2023, começando com uma exposição de 22 a 28 de fevereiro, na Sotheby’s, em Londres, seguida por paradas em Tel Aviv (onde foi exposto no ANU – Museu do Povo Judeu), bem como em Dallas, Los Angeles e Nova York.
O Codex Sassoon é tão antigo quanto o Codex de Alepo, também chamado do Keter Aram Tzobá (a Coroa de Aram Tzobá),pois, na Torá, a cidade de Alepo é chamada de Aram Tzobá. Este antigo códice antecede o Codex de Leningrado em quase um século. Notas encontradas no Codex Sassoon revelam que seu escriba teria efetivamente consultado o Códice de Alepo. O Keter Aram Tzobá deve seu nome ao fato de ter sido zelosamente guardado, por mais de 600 anos, na Grande Sinagoga de Alepo. O cuidado com o Keter era tanto que ele era zelosamente guardado dentro da Caverna de Eliahu Hanavi, em um cofre de ferro, e pouquíssimas pessoas eram autorizadas a consultá-lo.
O destino do Keter Aram Tzobá, assim como dos judeus alepinos, mudou no dia 29 de novembro de 1947, após a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovar a partilha da Palestina sob Mandato Britânico e a criação de dois estados, um árabe e um judeu. Mal tinham transcorrido 48 horas dessa declaração para que fossem deslanchados violentos tumultos antijudaicos, que culminaram com o incêndio da Grande Sinagoga. Durante o incêndio, o Keter ficou danificado, mas, felizmente, membros da comunidade conseguiram salvá-lo. Os judeus que ficaram em Alepo mantiveram-no escondido durante dez anos. E foi apenas em 1957 que conseguiram contrabandear o precioso manuscrito para a Turquia, de onde foi levado, finalmente, para Jerusalém, em 1958. Chegando a Israel, foi entregue ao Instituto Ben-Zvi e colocado em compartimento especial, climatizado. E em 1986 foi levado para restauração nos laboratórios do Museu de Israel, onde passou a ser exposto.
Ao contrário do Keter Aram Tzobá, o Codex Sassoon permaneceu quase intacto ao longo dos séculos. Um único escriba o escreveu em pele de mais de 100 animais, para criar suas quase 400 folhas de pergaminho, equivalentes a 792 páginas, além de ser considerado uma obra-prima nessa arte de escrita.
Nos primeiros séculos de sua existência, o Codex mudou de mãos pelo Oriente Médio, sendo transmitido, em 1000 E.C., de seu proprietário, Khalaf ben Abraham, para Isaac ben Ezequiel al-Attar e, em seguida, para seus filhos Ezequiel e Maimônides. Finalmente, no século 13, o Codex Sassoon foi doado à sinagoga de Makisin, atual Markada, no nordeste da Síria. A cidade de Makisin e sua sinagoga foram destruídas por volta de 1400. O Codex foi confiado à guarda de Salama ibn Abi al-Fakhr, que deveria devolvê-lo assim que a sinagoga fosse reconstruída.
Como a sinagoga nunca foi reconstruída, a odisseia do Codex seguiu em frente, às escuras, até esse valioso manuscrito reaparecer no mercado, em 1929, quando foi adquirido pelo colecionador e erudito David Solomon Sassoon. Após tê-lo adquirido, Sassoon imprimiu seu ex-libris na capa interna da encadernação, atestando sua posse. Esse erudito morreu em Islington, Londres, em 1942. Algumas de suas coleções começaram a ser leiloadas ou doadas a instituições britânicas, entre 1975 e meados da década de 1990, como forma de quitar impostos em atraso.
Em 1978, os descendentes de Sassoon venderam o valioso Codex para o British Rail Pension Fund, sendo exposto, em 1982, no Museu Britânico, antes de ser novamente leiloado pela Sotheby’s, em 1989, pela soma de £ 2.035.000 (cerca de $8 milhões em valores atuais), a um negociante que o vendeu, em seguida, ao banqueiro suíço Jacqui Safra, por um valor desconhecido.
O Codex Sassoon foi posto novamente a venda pela Sotheby’s e acabou sendo vendido agora, em 17 de maio de 2023, por 38 milhões de dólares, em Nova York. A obra composta de 400 folhas mede cerca de 30 x 35 centímetros e pesa cerca de 11 quilos. Sua capa foi feita em couro marrom, no início do século 20, e traz gravado na lombada o número 1053 — seu número de catálogo na coleção de Sassoon.
O valor monetário do Codex Sassoon se deve à raridade e preciosidade do manuscrito. Segundo Sharon Liberman Mintz, especialista sênior em Judaica na Sotheby’s, o Codex constitui “um dos maiores tesouros do mundo. O Tanach é o texto sagrado fundamental para todos os povos. Os cristãos reverenciam os textos como o Antigo Testamento e o Islã ensina que a Torá foi revelada pelo Divino. Indiscutivelmente, o Tanach constitui a obra mais influente da história humana e a base da civilização ocidental”.
Logo após o leilão, a Sotheby’s revelou que o comprador foi a organização Amigos Americanos do ANU – Museu do Povo Judeu, localizado em Tel Aviv. A aquisição foi possível devido a uma doação de Alfred H. Moses, ex-embaixador na Romênia, e de sua família. O Codex Sassoon integrará a exposição central do Museu ANU, anteriormente conhecido como Museu da Diáspora Judaica.
Irina Nevzlin, presidente do Conselho do Museu ANU, afirmou: “Para nós, a possibilidade de tê-lo no museu, acessível a milhões de pessoas, é algo que reforça nossas raízes e nossa identidade. O Codex está de volta a Israel, está voltando para casa. E aqui é seu lugar de direito!”.
1. A palavra Tanach éum acrônimo dos nomes das trêsdivisões que o compõem: Torá (Pentateuco), Nevi’im (Profetas) e Ketuvim (Escritos).
. Fontes:
Revista Morashá - Edição 119 - Junho de 2023
http://www.morasha.com.br/mundo-judaico/codex-sassoon-o-manuscrito-mais-antigo-do-tanach.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário