O judeu Vladimir Herzog foi morto aos 38 anos, após se apresentar espontamente para depor no DOI-Codi/SP, durante a ditadura militar
Brasília (DF) - Mais de quatro décadas depois da morte de Vladimir Herzog, em 24 de outubro de 1975, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CorteIDH) condenou, nesta quarta-feira, o Estado brasileiro pela falta de investigação, julgamento e sanção dos responsáveis pela tortura e assassinato do jornalista.
O jornalista e professor judeu Vladimir Herzog, foi preso, interrogado, torturado e morto
O Brasil terá de seguir uma série de determinações do tribunal. A decisão veio na mesma semana em que outra execução do período de regimes militares na América do Sul foi julgada no Chile. Na terça-feira, a Justiça chilena condenou nove militares reformados pelo assassinato do cantor e compositor Víctor Jara, um dos mais populares do país, morto com 44 tiros dias após o golpe de Estado que instalou a ditadura de Augusto Pinochet, em 1973.
Para a Corte, o Estado é responsável pela violação ao direito de “conhecer a verdade e a integridade pessoal” em prejuízo dos parentes de Herzog. O documento menciona a mãe, Zora; a mulher, Clarice; e os filhos, André e Ivo Herzog. A Corte ordenou o Estado a reiniciar, com a devida diligência, a investigação e o processo penal cabíveis pelos fatos ocorridos em 1975 para identificar, processar e, se necessário, punir os responsáveis pela tortura e morte de Herzog.
Também determinou reconhecer, sem exceção, que não haverá prescrição, por se tratar de crimes contra a humanidade e internacionais. A Corte exige ainda que se promova um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional em desagravo à memória de Herzog, que se publique a sentença e que sejam pagas as despesas do processo.
O tribunal internacional concluiu ainda que o “descumprimento do direito de conhecer a verdade” foi causado pela versão falsa da morte de Herzog, da negativa, por parte do Estado, de entregar documentos militares e da ausência de identificação dos responsáveis.
Herzog foi declarado morto em consequência de “suicídio”, versão contestada pela família do jornalista e também no processo
"A CorteIDH determinou que os fatos ocorridos contra Vladimir Herzog devem ser considerados como um crime contra a humanidade, como é definido pelo direito internacional", diz a sentença de cinco páginas.
O tribunal informou ainda que, devido à falta de investigação, o Estado brasileiro também violou os direitos às garantias judiciais e à proteção judicial dos familiares da vítima, identificados como Zora, Clarice, André e Ivo Herzog.
Em outro trecho, o documento destaca a tensão vivida no Brasil no período em que Herzog morreu, principalmente os atos das forças policiais “cometidos em um contexto sistemático e generalizado de ataques à população civil”.
. Caso:
Aos 38 anos, Vladimir Herzog apresentou-se de forma voluntária para depor perante autoridades militares do DOI/Codi de São Paulo. Ele foi preso, interrogado, torturado e morto. Herzog foi declarado morto em consequência de “suicídio”, versão contestada pela família do jornalista e também no processo. O processo ressalta que, na época, o Brasil vivia em plena ditadura e havia ataques contra a população civil considerada "opositora" à ditadura brasileira, e, em particular, contra jornalistas e membros do Partido Comunista Brasileiro.
Parentes do jornalista apresentaram, em 1976, uma ação civil na Justiça Federal que desmentiu a versão do suicídio e, em 1992, o Ministério Público do Estado de São Paulo pediu a abertura de uma investigação policial, mas o Tribunal de Justiça considerou que a Lei de Anistia era um obstáculo para investigar. Após uma nova tentativa de investigação, em 2008, o caso foi arquivado por prescrição, segundo o processo.
Corpo do jornalista Vladimir Herzog entregue à família, depois da necrópsia, para sepultamento no Cemitério Israelita do Butantã (SP)
. Arbitrariedades:
Durante o processo, o Brasil admitiu que houve prisão arbitrária, tortura e morte de Herzog, causando “severa dor” à família e reconhecendo responsabilidade. "Apesar de o Brasil ter empreendido diversos esforços para satisfazer o direito à verdade da família do senhor Herzog e da sociedade em geral, a falta de um esclarecimento judicial, a ausência de sanções individuais em relação à tortura e ao assassinato de Vladimir Herzog (...) violentou o direito de conhecer a verdade em prejuízo de Zora, Clarice, André e Ivo Herzog", indicou a sentença.
A CorteIDH, com sede em São José, na Costa Rica, faz parte da Organização dos Estados Americanos (OEA). As resoluções devem ser acatadas de forma obrigatória.
Durante o processo, o Brasil admitiu que houve prisão arbitrária, tortura e morte de Herzog, causando “severa dor” à família e reconhecendo responsabilidade
. MDH: sentença terá cumprimento integral:
Em nota, o Ministério dos Direitos Humanos informou que "dará cumprimento integral à sentença". "Este ministério reafirma o seu compromisso com as políticas públicas de direito à memória, à verdade e à reparação, reconhecendo a sua importância para a não repetição, no presente, de violações ocorridas no passado, tais como as práticas de tortura e limitações à liberdade de expressão", diz o texto.
A sentença, "ainda que condenatória ao Estado brasileiro, representa uma oportunidade para reforçar e aprimorar a política nacional de enfrentamento à tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, assim como em relação à investigação, processamento e punição dos responsáveis pelo delito", acrescenta a nota.
. Fonte:
Por Agência Brasil - Publicado às 21h47 de 04/07/2018 - Atualizado às 13h27 de 05/07/2018
https://odia.ig.com.br/brasil/2018/07/5555195-corte-internacional-condena-brasil-por-nao-investigar-morte-de-herzog.html
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