Jornal do Brasil - Histórias que devem ser contadas - Ricardo Schott

Autora do livro Vivência judaica em Nilópolis (Imago), a polonesa Esther London, morta em 2007 aos 92 anos, é um dos fios condutores do documentário Judeus em Nilópolis, do jornalista Radamés Vieira, ainda sem data de lançamento. O vídeo conta a história de 300 famílias judias que se estabeleceram no município da Baixada Fluminense a partir de 1920. As famílias, incluindo a de Esther (que foi para lá assim que se casou, com um polonês, no Brasil), mesmo passando por sérias dificuldades financeiras, praticamente desbravaram o município, montando uma numerosa comunidade e até construindo uma sinagoga, a Tiferet Israel, fechada desde 1970.
– Um dos objetivos do documentário é chamar a atenção do poder público para a necessidade da preservação dessa sinagoga. É um prédio histórico, completamente abandonado – diz Vieira, orgulhoso de ter conseguido entrevistar Esther a tempo. – Ela me inspirou muito, tinha uma memória fantástica. Falou a respeito da chegada dos judeus ao Brasil, das coisas que não existiam na Polônia. E eles foram responsáveis pelo começo da urbanização do município.
Filho de Esther, o engenheiro Pedro London lembra, saudoso, da comunidade.
– Lá se falavam quatro línguas: português, polonês, hebraico e iídiche. E havia detalhes singulares – recorda. – Hoje não há judeus sapateiros ou mecânicos. Havia vários, até porque a profissão de sapateiro era valorizada na Polônia. E ainda havia convivência entre imigrantes judeus e árabes, que também viviam na região.
A colonização em Nilópolis ocorreu quando já havia vários judeus em locais centrais do Rio, como a Praça 11. Também havia judeus em bairros como Madureira e Méier. Mas o município da Baixada Fluminense tornou-se o epicentro dos imigrantes. Boa parte deles vinha da Polônia, numa época em que a Rússia czarista perseguia a população judaica. Eles se estabeleceram nos arredores da Avenida General Mena Barreto, no Centro de Nilópolis.
– A Praça 11 já estava superlotada. E os terrenos em Nilópolis eram baratos. Além disso, pela linha férrea, era o primeiro município após o Rio – diz o diretor, que promoveu um encontro de ex-moradores judeus da cidade (alguns já morando em Israel há décadas) que começava com uma viagem de trem. – Também lançamos em português o livro Novos lares, editado em íidiche em 1932 por Adolfo Kischinevisky, que morava em Nilópolis. O livro foi traduzido pela Sara Morelenbaum, mãe do (violoncelista) Jaques.
Vieira, que não é judeu, mas morava em Nilópolis na época em que a cidade era habitada por muitos judeus, pôs-se a correr atrás de personagens. Entre telefonemas e viagens internacionais, reencontrou amigos de infância, como Chaim Litewski, hoje jornalista em Nova York, e descobriu que pessoas conhecidas, como a atriz Teresa Rachel e o secretário municipal de Saúde, Jacob Kligerman, são judeus de Nilópolis.
– Com exceção de poucos, os judeus não têm relação com a cidade desde os anos 70 – lembra Vieira. – Hoje ficaram só a sinagoga e o cemitério comunal Israelita de Nilópolis, construído em 1935.
Vieira, que teve apoio financeiro do Centro da Cultura Judaica (da Casa de Cultura de Israel), aguarda a finalização do documentário. Já foram gastos R$ 100 mil na realização e faltam R$ 50 mil terminá-lo. Ele crê que o filme pode servir para dirimir lugares-comuns.
– Os judeus progrediram, sim. Mas, no Brasil, tiveram toda uma história de luta, que as pessoas não conhecem – conta.
07 de julho de 2008 : 01h00m.