28 de junho de 2013

A RAZÃO DA QUEDA DOS DOIS TEMPLOS SAGRADOS EM JERUSALÉM



Tisha B'Av, o nono dia do mês judaico de Menachem Av, é um dia de luto nacional para o Povo Judeu porque nesta data foram destruídos o Primeiro e o Segundo Templo.
Com exceção de Yom Kipur, Tisha B'Av é a única data do nosso calendário na qual somos obrigados a jejuar durante mais de 24 horas. Mas, enquanto Yom Kipur é um dos dias mais felizes do ano, um dia de Perdão e Clemência Divina, Tisha B'Av é o dia mais triste do calendário judaico. É a culminação de um período de três semanas de luto nacional que se inicia em 17 de Tamuz - um dia de jejum que começa antes do amanhecer e termina após o pôr-do-sol.

Foi no dia 9 de Menachem Av que o Primeiro e o Segundo Templo Sagrado de Jerusalém foram destruídos. Construído pelo Rei Salomão, filho e herdeiro do Rei David, o primeiro Beit Hamicdash foi destruído em 422 antes da Era comum pelos exércitos de Nabucodonosor, rei da Babilônia.

O segundo, erguido sob a liderança de Ezra após a volta dos judeus de um exílio de 70 anos, na Babilônia, foi destruído 490 anos após o Primeiro Templo pelas legiões romanas que exilaram os judeus da Terra de Israel.



Jejuamos e lamentamos em Tishá B'Av a destruição do Templo Sagrado por ser esta a causa primordial do sofrimento do Povo Judeu. As conseqüências foram dramáticas: exilado da Terra de Israel, nosso povo se dispersou pelos quatro cantos do mundo, permanecendo durante dois mil anos à mercê de outras nações. Foram dois milênios de perseguição, discriminação, expulsões, pogroms e mortes que culminaram na Shoá.

A destruição do Templo Sagrado, Morada de D'us na Terra, teve sérias conseqüências e continua tendo, não só para o Povo Judeu, mas para a humanidade como um todo. Poucos sabem que o Templo não era apenas o local mais sagrado da cidade mais sagrada da Terra, mas, em termos espirituais, era o escudo protetor do mundo, pois os serviços lá realizados expiavam não somente os pecados dos Filhos de Israel, mas também os de toda a humanidade. Desde a destruição do Templo, os homens perderam uma grande fonte de proteção.

Nossos Sábios ensinam que nas gerações em que o Templo não for reconstruído é como se o mesmo tivesse sido novamente destruído. Isto significa que continuam sendo cometidos os mesmos pecados e erros que causaram a queda do Primeiro e Segundo Templo. Somente quando aprendermos com estes erros, quando deixarmos de cometê-los, o Terceiro Templo será construído, estabelecendo na Terra a utopia com a qual o homem sempre sonhou.




Por que o Primeiro Templo caiu

No Talmud, no Tratado de Yoma, está escrito que o Primeiro Templo foi destruído porque na época os judeus cometiam três pecados capitais: idolatria, imoralidade (adultério e incesto) e assassinato. Mas, ainda no Talmud, o Tratado de Nedarim aponta para outra razão. Está escrito que o Primeiro Templo caiu porque antes de estudar a Torá os judeus não recitavam a bênção apropriada.

Idolatria, imoralidade e assassinato - pecados tão graves que um judeu não pode cometê-los nem para salvar sua vida - podem até justificar a destruição do Templo e o exílio do nosso povo da Terra de Israel. Mas o fato de não recitar uma bênção antes de estudar Torá parece ser uma infração técnica, algo que não poderia ter conseqüências tão catastróficas. No entanto, explicam nossos Sábios que o fato de os judeus cometerem pecados cardeais tão graves, que levaram à destruição do Primeiro Templo, está ligado à forma como se relacionavam com a Torá.

Pergunta o Maharal de Praga, grande cabalista famoso por ter construído o Golem: "Por que a Terra está-se perdendo? A resposta dada por ele é que a Torá foi abandonada. E o que significa abandonar a Torá? Significa não a bendizer". Pois, abençoar a Torá antes de estudá-la - declarando "Santificado és Tu, o Eterno,.... que nos deste a Tua Torá" - é reconhecer que esta pode ser uma dádiva, mas que a Torá ainda pertence a D'us, não a nós. Por outro lado, não recitar a bênção antes de estudá-la, significa removê-la da esfera da santidade. É tratar a Torá, que é a Vontade e a Sabedoria Divina, como qualquer outra obra literária, estudando-a como se fosse matéria da história ou do direito. É transformar o sagrado em profano - e esta é a própria definição de sacrilégio. É ofender tanto à própria Torá como Àquele que a outorgou ao Povo Judeu.




Apesar de D'us estar disposto a relevar muitos dos erros e pecados que cometemos, a omissão em relação à bênção da Torá é algo que Ele não pode ignorar. Fica mais fácil entender a gravidade disso através de uma simples analogia: se alguém se machucar, a dor é transmitida ao cérebro. Mas a ferida mais perigosa é aquela que atinge diretamente o cérebro. Diminuir a santidade da Torá é atingir o âmago do judaísmo, pois esta é como um fio de alta tensão que conecta o homem finito com o Criador Infinito. Se alguém decidir brincar com esse fio de alta tensão - ao interpretar a Torá da forma que lhe convém, mudando ou revogando suas leis, ou a explorando em benefício próprio - corre o risco de ferir sua alma. Ao tratar a Torá como se fosse uma obra humana e não Divina, rompe a ligação desse fio espiritual com sua Fonte. Quando isso acontece, escreve o Maharal de Praga, a Torá trazida por Moshé dos Céus à Terra perde a sua permanência. Deixa de ser a Árvore da Vida e passa a ser uma árvore cortada de sua Raiz, e, inexoravelmente, definhará e acabará por morrer. Isso foi o que levou o povo a cometer pecados tão graves, na época do Primeiro Templo.

Na realidade, os três pecados cometidos foram a matriz de todas as transgressões. A idolatria representa todos os pecados contra D'us; a imoralidade sintetiza todos os que são cometidos por causa de desejos imorais e egoístas; e o assassinato simboliza toda a maldade que o homem comete contra outros seres humanos. Em muitos casos, tais pecados são cometidos quando os homens abandonam a Palavra de D'us, desconectando-se Dele.

Ao ser arrancada de sua Raiz, a Torá se torna apenas mais um código de leis, que pode ser mudado ou até descartado. Não surpreende, portanto, que justamente na época em que os judeus não costumavam bendizer a Torá, a idolatria se tenha disseminado. Ambos os fenômenos são meios pelos quais o homem remove de si o jugo Celestial. Como ressalta o Talmud, os judeus jamais praticaram a idolatria por serem tolos o suficiente para acreditarem em seu poder. Muito pelo contrário: as pessoas adoravam estátuas, estrelas e um bezerro de ouro por serem objetos inanimados, sem poder algum, que nada proíbem ou exigem, e que não punem. Por outro lado, ao nos transmitir Sua Vontade através da Torá, D'us nos deu uma longa lista do que devemos e do que não podemos fazer, e Ele está sempre atento às nossas ações e omissões.

É de extrema importância ressaltar que ofender a Torá não é uma questão de observância religiosa, mas sim de como cada um de nós se relaciona com a Vontade Divina. Aquele que a honra, a considera sagrada, a Palavra de D'us, mesmo que ele próprio não viva sempre de acordo com suas leis ou seu espírito. Tal pessoa vive em um universo centrado no Todo Poderoso. O problema surge quando o indivíduo se coloca no centro do universo e acredita que a Torá deve adaptar-se a ele. Quando isso acontece, a pessoa abandona a Torá de D'us e a transforma em sua própria Torá. E quanto mais a pessoa segue este caminho, maior dano espiritual causa. As conseqüências, como na época da queda do Primeiro Templo, são pecados contra D'us e contra o homem.




Por que caiu o Segundo Templo

Uma das conseqüências da destruição do Primeiro Templo foi o exílio babilônico, que durou 70 anos. Foi um exílio extremamente curto, como um piscar de olhos, quando comparado ao de 2.000 anos iniciado após a queda do Segundo Templo. Mas, por que o Segundo Templo foi destruído? E por que o segundo exílio foi desproporcionalmente mais longo e mais difícil do que o primeiro? O Talmud nos responde: durante a época do Segundo Templo, apesar de serem judeus observantes, os judeus odiavam uns aos outros. Estudavam a Torá da maneira correta, seguiam suas leis e até faziam atos de bondade e caridade. Mas se odiavam e difamavam uns aos outros, nutriam ressentimentos e se alegravam com a desgraça alheia. Nossos Sábios, então, concluem: se a extensão do exílio é uma medida para avaliar a gravidade de um pecado, o ódio entre judeus é pior do que ofender a Torá e cometer os três pecados cardeais.

De fato, Maimônides escreve que a Torá foi dada para estabelecer a paz no mundo. Seu propósito é aproximar os judeus de D'us e, também, uns dos outros. É verdade que quando alguém - por rancor ou indiferença, e não por falta de conhecimento - deixa de abençoar a Torá, ele a ofende. Mas quando um judeu odeia outro judeu, seu ato é muito pior: ele nega a Torá, pois invalida seus objetivos. Além do mais, o ódio entre judeus é uma afronta à Unidade d'Aquele que nos deu a Torá. É verdade que sabemos muito pouco sobre D'us, mas sabemos que Ele é absolutamente Um. Quando nós, Seu Povo, estamos unidos, refletimos a Sua Unidade.

Rashi, o clássico comentarista da Torá, escreve que quando esta foi dada no Monte Sinai, os judeus estavam tão unidos quanto um homem com um único coração. Foi esta unidade que os tornou merecedores da Revelação de D'us e da outorga de Sua Palavra. O maior momento da história judaica aconteceu quando o povo estava unido. Não surpreende, pois, que o pior acontecimento da epopéia judaica - o dia de Tishá B'Av, no qual o Segundo Templo foi destruído, levando os judeus ao seu mais longo exílio - tenha ocorrido quando prevaleciam as lutas internas e a desunião entre nós.




Unidade no seio de nosso povo, não significa que todos devamos concordar sobre todo e qualquer assunto. Significa, porém, que jamais devemos deixar de nos ver como parte de um organismo único. Quando judeus odeiam judeus - quando se ressentem, caluniam e se rejeitam, uns aos outros - estão prejudicando mais o Povo Judeu do que o conseguiriam os nossos inimigos. Não há guerra mais cruel e devastadora do que a guerra fratricida, travada entre irmãos. Uma analogia pode ajudar a entender este princípio: doenças do sistema auto-imune são as mais terríveis e em muitos casos letais. Ocorrem quando o organismo deixa de se reconhecer como uma unidade e passa a considerar certas partes dele mesmo como elementos estranhos, indesejáveis. Reage como se estivesse diante de invasores, tentando expulsá-los. No caso de certas doenças, o resultado é fatal.

Essa analogia explica a razão para a destruição do Segundo Templo e para os 2.000 anos de exílio. Quando os judeus se voltam uns contra os outros - quando tratam outros judeus como indesejáveis - estão agindo como a doença auto-imune, inconscientes de que estão atacando não um corpo estranho, mas a si mesmos.Portanto, ainda que seja inegável que há diferenças importantes e, às vezes, dolorosas entre os diferentes grupos que integram o Povo Judeu, jamais podemos esquecer que somos todos partes de um mesmo organismo. Um indivíduo pode estar insatisfeito com algumas correntes judaicas - pode desaprovar seus costumes, visão política ou grau de observância religiosa - mas ninguém pode negar que todos fazemos parte do mesmo povo e que, apesar das discordâncias e dos argumentos, são "meu osso e minha carne" (Gênese 29:14). Como nos ensina o misticismo judaico, o Povo Judeu faz parte de uma única alma cujas faíscas encarnam em corpos diferentes.
O Terceiro Templo de Jerusalém será mais grandioso que os dois primeiros. Ele poderia e deveria ter sido construído há muitos e muitos anos. Se ainda não foi - se nós ainda jejuamos e nos lamentamos em Tishá B'Av - é porque ainda não retificamos totalmente os pecados que levaram à queda dos dois Templos.




O Zohar, obra fundamental da Cabalá, fala do triângulo espiritual que une D'us, Sua Torá e Seu Povo. O Rebe de Lubavitch, que dedicou sua vida para acabar com o exílio do Povo Judeu, ensinou que se encontrarmos um judeu que ama a D'us, mas que não tem amor pelo seu povo e pela Torá, devemos dizer-lhe que seu amor não perdurará. No entanto, se encontrarmos um judeu que ama seu povo, mas que não tem amor por D'us e pela Torá, devemos trabalhar com ele para alimentar seu amor por seu povo até que este transborde em direção aos outros dois, até que os três amores se unam em um único nó forte que jamais há de se romper.

Quando nós nos unirmos, como indivíduos e como povo, e nos aproximarmos de D'us e de Sua Torá, teremos finalmente retificado os erros das gerações que nos precederam. Quando isso acontecer, todos os judeus retornarão a Israel e o Terceiro Templo será construído. Como todos os nós do triângulo que unem D'us, Sua Torá e Seu Povo jamais serão rompidos, não haverá outro exílio e o Terceiro Templo perdurará para sempre. Este servirá como proteção e bênção para toda a humanidade, e a santidade da Terra de Israel se espalhará e cobrirá todos os cantos da Terra.

Fonte: Revista Morash'a
Edição 61 - julho de 2008

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