O jornalista Leonardo Ferreira, natural do Rio de Janeiro (RJ), é formado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo, pós-graduado em Gestão Comercial & Marketing Digital, pós-graduado em Transtorno do Espectro Autista: Inclusão Escolar & Social, além de membro do Templo Beth-El of Jersey City (www.betheljc.org). O templo foi fundado no estado de New Jersey (EUA), em 1864.
2 de setembro de 2008
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GUIA PARA ATUAR EM PROL DOS JUDEUS POR OPÇÃO
Cada membro da comunidade judaica pode dar certos passos com o intuito de aumentar o número de conversões ao judaísmo. Naturalmente, os rabinos cumprem o principal papel no processo de conversão porque são eles que instruem os potenciais candidatos e supervisionam a conversão em si. Porém, qualquer judeu pode contribuir com o esforço de acolher aqueles que querem fazer parte do povo judeu na sua histórica jornada espiritual.
Há dez passos que você pode dar a fim de aumentar o número de conversões ao judaísmo:
(1) Aprenda sobre o processo de conversão ao judaísmo sob a ótica da história e do pensamento judaicos, bem como na vida judaica contemporânea. Há cada vez mais material a respeito, incluindo livros, panfletos e vídeos sobre conversão produzidos por todos os movimentos religiosos (ortodoxo, conservador/massortí e reformista), e de forma mais geral por parte de editoras judaicas e não-judaicas. No Brasil esse material ainda é escasso: há mais material produzido por rabinos ortodoxos e publicado pela Editora Sefer (www.sefer.com.br) como, por exemplo, a obra “Bem-vindos ao Judaísmo” do rabino ortodoxo Maurice Lamm. Para obter uma orientação adequada sobre o que ler e conhecer, converse com um rabino, um educador ou um editor judeu. Certifique-se de que esse material está disponível na biblioteca da sua sinagoga, congregação, comunidade judaica ou grupo de jovens judeus.
(2) Veja o que já está disponível na sua comunidade para candidatos potenciais à conversão. Verifique isso na sua sinagoga, na Casa de Cultura Judaica da sua cidade, se houver, e nas organizações judaicas locais. Será que já há na sua congregação, por exemplo, turmas de Introdução ao Judaísmo abertas para candidatos à conversão? Há algum grupo de voluntários que se dispõe a dar suporte para a aceitação, socialização e integração dos judeus por opção? Ofereça-se para dar apoio a essas iniciativas. Você pode, por exemplo, ser um voluntário que atuará na área de divulgação, ou talvez um candidato à conversão precise de uma carona para ir às aulas ou de algum outro tipo de ajuda que você é capaz de oferecer. Talvez você possa subsidiar os custos de um curso de introdução ao judaísmo ou pagar um anúncio dessas turmas em algum jornal local ou comunitário. Você pode ter algumas habilidades especiais, tais como preparar apresentações em Power Point, vídeos ou apostilas que poderão ser úteis às aulas.
(3) E se não há uma turma ou grupo de estudos de Introdução ao Judaísmo? Converse com seu rabino ou outro membro da diretoria da sua congregação, ou mesmo com outros líderes da comunidade judaica, a respeito de oferecer essas turmas ou grupos de estudo, talvez em conjunto com outras instituições judaicas. Ofereça-se como voluntário para formar turmas ou grupos. Os rabinos muitas vezes estão sobrecarregados e com certeza irão elogiar o seu estímulo, apoio e vontade de ajudar. Aprenda sobre o que o movimento judaico ao qual você faz parte está fazendo nesse sentido e se ofereça para ajudar. Aprenda sobre o que organizações independentes como a Kulanu (instituição americana que busca dar apoio a comunidades judaicas afastadas ou a pessoas que buscam se integrar ao povo judeu) estão fazendo em favor dos candidatos à conversão. No Brasil não há instituições independentes com tais características, mas poderíamos, por exemplo, ter alguns voluntários ligados à Kulanu no Brasil, por que não? Você pode conhecer alguém que ajude essa iniciativa.
(4) Converse sobre o tema da conversão ao judaísmo com outros interessados no assunto, como por exemplo o cônjuge judeu de um casamento misto ou os pais deste judeu (judia). Estimule essas pessoas a considerar a conversão como uma possibilidade real. Muitos parceiros não-judeus de um casamento misto sequer sabem que têm a opção de se converter ao judaísmo.
(5) Reúna informações gerais sobre conversão para distribuir a pessoas e instituições locais como sinagogas, Centros de Cultura Judaica, bibliotecas e outros locais em que você pediu e obteve permissão para deixar tais materiais. Junto ao material do seu movimento judaico, sinta-se à vontade para imprimir e distribuir o material deste site, desde que você não se esqueça de dar o devido crédito. Você também pode ajudar a buscar patrocínio para que o conteúdo deste site possa ser transformado em pequenas brochuras e panfletos.
(6) Divulgue o tema da conversão ao judaísmo. Acompanhe a mídia para conhecer histórias de conversão e escreva apoiando essas histórias. Indique histórias como essas para repórteres da mídia local. Escreva cartas ao editor em apoio à conversão. Se possível, dê palestras e estimule outros a falar publicamente sobre o tema. Por exemplo, sugira a alguma organização judaica local para que convide judeus por opção a contar sobre suas experiências.
(7) Ajude aqueles que se converteram a se integrar completamente na vida judaica. Algumas pessoas precisam de um conselheiro familiar. Talvez você possa ajudar novos judeus a se familiarizar com as orações, os pratos típicos, ou filmes e livros judaicos. Trabalhe com o grupo de apoio às conversões ou ajude a formar um. Converse com seu rabino a respeito disso.
(8) Apóie os esforços da comunidade judaica em aceitar e acolher os convertidos. Ajude a tornar esse esforço público para que mais e mais judeus compreendam, aceitem e apóiem os judeus por opção.
(9) Se você pertence a alguma organização judaica, sugira o tema da conversão ao judaísmo como tópico de discussão para uma das reuniões. Providencie um palestrante ou se comprometa a ler algo sobre o assunto.
(10) Finalmente, converse com outros judeus de nascimento sobre o assunto. Muitos nascidos judeus são criados sob a crença equivocada de que acolher convertidos sinceros vai contra a tradição judaica, ou que convertidos não são judeus “de verdade”. É particularmente importante que os pais de um filho ou filha casado(a) com um não-judeu entendam que, se o seu genro ou nora se converter, a família será genuinamente judia, e se a conversão ocorrer antes do matrimônio, esse casamento será genuinamente judaico.
Vistas em conjunto, estas e outras ações correlacionadas podem fazer com que a comunidade judaica seja mais receptiva aos convertidos (ou judeus por opção). Uma comunidade mais acolhedora irá atrair muita gente que enxerga no judaísmo uma visão de mundo correta e um modo de vida valoroso. Em contrapartida, nós judeus iremos receber muitos novos membros verdadeiramente dedicados às nossas comunidades.
Créditos:
Texto adaptado do site em inglês www.convert.org com a permissão de Barbara Shair
Tradução: Adriana Lacerda
Edição: Uri Lam
Há dez passos que você pode dar a fim de aumentar o número de conversões ao judaísmo:
(1) Aprenda sobre o processo de conversão ao judaísmo sob a ótica da história e do pensamento judaicos, bem como na vida judaica contemporânea. Há cada vez mais material a respeito, incluindo livros, panfletos e vídeos sobre conversão produzidos por todos os movimentos religiosos (ortodoxo, conservador/massortí e reformista), e de forma mais geral por parte de editoras judaicas e não-judaicas. No Brasil esse material ainda é escasso: há mais material produzido por rabinos ortodoxos e publicado pela Editora Sefer (www.sefer.com.br) como, por exemplo, a obra “Bem-vindos ao Judaísmo” do rabino ortodoxo Maurice Lamm. Para obter uma orientação adequada sobre o que ler e conhecer, converse com um rabino, um educador ou um editor judeu. Certifique-se de que esse material está disponível na biblioteca da sua sinagoga, congregação, comunidade judaica ou grupo de jovens judeus.
(2) Veja o que já está disponível na sua comunidade para candidatos potenciais à conversão. Verifique isso na sua sinagoga, na Casa de Cultura Judaica da sua cidade, se houver, e nas organizações judaicas locais. Será que já há na sua congregação, por exemplo, turmas de Introdução ao Judaísmo abertas para candidatos à conversão? Há algum grupo de voluntários que se dispõe a dar suporte para a aceitação, socialização e integração dos judeus por opção? Ofereça-se para dar apoio a essas iniciativas. Você pode, por exemplo, ser um voluntário que atuará na área de divulgação, ou talvez um candidato à conversão precise de uma carona para ir às aulas ou de algum outro tipo de ajuda que você é capaz de oferecer. Talvez você possa subsidiar os custos de um curso de introdução ao judaísmo ou pagar um anúncio dessas turmas em algum jornal local ou comunitário. Você pode ter algumas habilidades especiais, tais como preparar apresentações em Power Point, vídeos ou apostilas que poderão ser úteis às aulas.
(3) E se não há uma turma ou grupo de estudos de Introdução ao Judaísmo? Converse com seu rabino ou outro membro da diretoria da sua congregação, ou mesmo com outros líderes da comunidade judaica, a respeito de oferecer essas turmas ou grupos de estudo, talvez em conjunto com outras instituições judaicas. Ofereça-se como voluntário para formar turmas ou grupos. Os rabinos muitas vezes estão sobrecarregados e com certeza irão elogiar o seu estímulo, apoio e vontade de ajudar. Aprenda sobre o que o movimento judaico ao qual você faz parte está fazendo nesse sentido e se ofereça para ajudar. Aprenda sobre o que organizações independentes como a Kulanu (instituição americana que busca dar apoio a comunidades judaicas afastadas ou a pessoas que buscam se integrar ao povo judeu) estão fazendo em favor dos candidatos à conversão. No Brasil não há instituições independentes com tais características, mas poderíamos, por exemplo, ter alguns voluntários ligados à Kulanu no Brasil, por que não? Você pode conhecer alguém que ajude essa iniciativa.
(4) Converse sobre o tema da conversão ao judaísmo com outros interessados no assunto, como por exemplo o cônjuge judeu de um casamento misto ou os pais deste judeu (judia). Estimule essas pessoas a considerar a conversão como uma possibilidade real. Muitos parceiros não-judeus de um casamento misto sequer sabem que têm a opção de se converter ao judaísmo.
(5) Reúna informações gerais sobre conversão para distribuir a pessoas e instituições locais como sinagogas, Centros de Cultura Judaica, bibliotecas e outros locais em que você pediu e obteve permissão para deixar tais materiais. Junto ao material do seu movimento judaico, sinta-se à vontade para imprimir e distribuir o material deste site, desde que você não se esqueça de dar o devido crédito. Você também pode ajudar a buscar patrocínio para que o conteúdo deste site possa ser transformado em pequenas brochuras e panfletos.
(6) Divulgue o tema da conversão ao judaísmo. Acompanhe a mídia para conhecer histórias de conversão e escreva apoiando essas histórias. Indique histórias como essas para repórteres da mídia local. Escreva cartas ao editor em apoio à conversão. Se possível, dê palestras e estimule outros a falar publicamente sobre o tema. Por exemplo, sugira a alguma organização judaica local para que convide judeus por opção a contar sobre suas experiências.
(7) Ajude aqueles que se converteram a se integrar completamente na vida judaica. Algumas pessoas precisam de um conselheiro familiar. Talvez você possa ajudar novos judeus a se familiarizar com as orações, os pratos típicos, ou filmes e livros judaicos. Trabalhe com o grupo de apoio às conversões ou ajude a formar um. Converse com seu rabino a respeito disso.
(8) Apóie os esforços da comunidade judaica em aceitar e acolher os convertidos. Ajude a tornar esse esforço público para que mais e mais judeus compreendam, aceitem e apóiem os judeus por opção.
(9) Se você pertence a alguma organização judaica, sugira o tema da conversão ao judaísmo como tópico de discussão para uma das reuniões. Providencie um palestrante ou se comprometa a ler algo sobre o assunto.
(10) Finalmente, converse com outros judeus de nascimento sobre o assunto. Muitos nascidos judeus são criados sob a crença equivocada de que acolher convertidos sinceros vai contra a tradição judaica, ou que convertidos não são judeus “de verdade”. É particularmente importante que os pais de um filho ou filha casado(a) com um não-judeu entendam que, se o seu genro ou nora se converter, a família será genuinamente judia, e se a conversão ocorrer antes do matrimônio, esse casamento será genuinamente judaico.
Vistas em conjunto, estas e outras ações correlacionadas podem fazer com que a comunidade judaica seja mais receptiva aos convertidos (ou judeus por opção). Uma comunidade mais acolhedora irá atrair muita gente que enxerga no judaísmo uma visão de mundo correta e um modo de vida valoroso. Em contrapartida, nós judeus iremos receber muitos novos membros verdadeiramente dedicados às nossas comunidades.
Créditos:
Texto adaptado do site em inglês www.convert.org com a permissão de Barbara Shair
Tradução: Adriana Lacerda
Edição: Uri Lam
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Conversões
CON - VERSÕES E FATOS
Rabino Nilton Bonder

A questão das conversões ao judaísmo, mais do que polêmicas entre os diversos movimentos judaicos, revela importantes tendências da auto-imagem dos judeus nos últimos séculos. A freqüente desconfiança dos judeus quanto à sinceridade dos conversos se baseia em parte no temor da corrosão pela assimilação e em parte pelo temor de utilização do judaísmo para "interesses próprios". Ambas considerações são relatadas desde os primeiros textos rabínicos sobre o assunto. Há, no entanto, um terceiro elemento de caráter bastante subjetivo e que é uma "fresh mutation", um desenvolvimento moderno da questão.
Diz respeito à evolução da idéia de que "ser judeu" é uma condição transmissível apenas pelo "sangue". Para colocar em linguagem contextualizada, não estamos falando de uma carga genética, terminologia muito recente, mas de uma "alma" que retrocede até o Monte Sinai. Este pedigree espiritual consiste numa forma de racismo que se expressa pela crença não de um corpo diferenciado, mas de uma alma diferenciada. Mais popularmente, essa forma de teologia ocupa o imaginário como sendo "impossível para um não-judeu entender o drama, a tragédia, a saga e a epopéia do judaísmo". Só uma "alma" moldada pela experiência histórica e amamentada por um "lar judaico" consegue produzir o "ser judeu".
Vamos fazer um passeio pelo conceito da "conversão" com o intuito de deixar exposta uma insegurança interna dos judeus que se manifesta externamente na questão da conversão. A possível falta de fidelidade do converso, sua capacidade de inocular o judaísmo de percepções errôneas, ou o seu potencial de diluir algo que é puro, revelam a fragilidade da identidade judaica moderna. É insuportável à grande massa de judeus não praticantes e absorvidos pela cidadania e pela globalização perceber que há pouca, quase nenhuma ou nenhuma diferença entre eles e os não judeus. Aumentar o valor do título para preservar a qualidade do clube, sem uma real benfeitoria no conteúdo e na qualidade do mesmo, é indicativo de decadência. Aparentemente resolvidos estariam os extremos - a ortodoxia e os judeus plenamente assimilados. O primeiro assume ser "diferente" dos outros seja em sua missão histórica ou, sob forma mística, em sua função cósmica. O segundo assume ser "um igual" e, portanto, questões como a conversão ou convenções de pertencimento pouco importam.
No entanto, ambas as posturas apenas dissimulam uma resolução definitiva. A ortodoxia, primeiramente, vive seu drama particular tendo que adotar posturas cada vez mais radicais de diferença num mundo de iguais. Não só a televisão fala de iguais, mas a moral, a ética, a cultura, a arte, a ciência, os mitos e os misticismos. A ortodoxia usufrui desta igualdade, depende desta igualdade, faz uso dela e precisa, ao mesmo tempo, constantemente se re-assegurar de que ela não existe. A vestimenta, as práticas e as idéias têm como função maior não tanto servir ao Criador, mas proteger o judeu. O segundo grupo, assume ares de resolvido para descobrir na primeira ou segunda geração que seus descendentes tornam-se confusos, não identificando em sua postura uma opção comunitária, mas uma desistência.
A palavra "guer" - converso - aparece no texto bíblico com o sentido de "estrangeiro". Sua raiz de significado "residir, habitar", transmite uma sensação de transitoriedade. "Moradores temporários vocês foram no Egito" diz o texto bíblico gerando uma das mais fortes identificações judaicas - vocês foram estrangeiros, vocês foram moradores temporários sentados sobre suas malas e vocês foram "conversos" em meio a outros. Não há dúvida que a expressão contém uma dubiedade. Se o converso é alguém que abraça uma cultura e uma fé, porque designa-lo para sempre como um "estrangeiro"?
Esta ambigüidade aparece nos textos em afirmações como "o converso é recebido de braços abertos e é tratado como um judeu" (Lev. R. 2:9) ou em discussões como a de se pode servir como juiz ou não ("um prosélito só pode servir como juiz em casos civis estando impedido de servir em casos criminais e, mesmo assim apenas para outro prosélito" - Iev. 102a).
Em certos casos a questão é de sensibilidade à diferença. Marcar a realidade de uma origem e de uma família externa ao judaísmo também aparece em discussões do tipo: "Como deve um converso se dirigir aos ancestrais judaicos? Nas orações deveria o converso dizer "Nosso D'us e D'us dos seus antepassados" ou "Nosso D'us e D'us de nossos antepassados"?". A pergunta é legítima do ponto de vista objetivo. Dizer que é o D'us de seus antepassados (tomando obviamente "D'us" por uma forma específica de relação com D'us) seria uma mentira. No entanto, Maimônides percebe a malícia implícita nesta "verdade" e sentencia em carta a um amigo convertido (Rambam, Responsa 42- ed. Freiman) "um converso deve dizer 'Nosso D'us e D'us de nossos ancestrais' ou 'que nos escolheu' ou 'que nos deu' ou 'que nos fez herdar', porque ao escolher se tornar um converso passou a ser um discípulo, um filho, de Abraão. Uma vez que se converte não há diferença entre eu e você...".
Na verdade, nenhuma outra tradição é tão marcada pela idéia de conversão como a judaica.
Seu fundador não é um profeta, um visionário que recebe importantes revelações, mas alguém que se associa a outro pacto diferente daquele de seus pais e de sua origem. Abraão é um personagem distinto de Moisés, de Buda, de Jesus ou mesmo de Maomé. Abraão é um converso que gradativamente converte também a sua mulher e as mulheres de seu filho e de seus netos.
Não só a tradição traça a origem de importantes personalidades como Rabi Akiva, Rabi Meir, Shemaia e Avtalion à conversões, mas os aponta como descendentes dos perversos Sancheriv, Sisera, Haman e Nero (Git. 56b). Isto demonstraria que a conversão é um ato de "nascimento" novo, independente do passado, seja do individuo ou de sua ancestralidade.
Simbolicamente isto se expressa pelo fato de ser o Messias descendente de conversos. Ruth a moabita, faz parte da linhagem direta do Rei David, o qual por sua vez é ancestral do Messias. Em resumo, Abraão é um converso, Moisés é um judeu que retorna e casa-se com uma não judia, Rabi Akiva é descendente de conversos e o Messias idem. Não há dúvida alguma que nos traços que hoje identificamos como tipicamente judeus - peles claras, meninos sardentos, ruivos, caucasianos, olhos claros e etc - há presença de misturas exógenas basicamente em todas as famílias. Poucos povos podem traçar tão diretamente sua origem a guerim, a estrangeiros, que passaram a morar, habitar, conviver e comportar-se com e como judeus.
O processo de dificultar as conversões assumindo aspectos cada vez mais rígidos, são bastante modernos. No século XVII, os conselhos judaicos da Lituânia e Moravia impuseram severas penalidades para o ato de proselitismo e para guarida oferecida a conversos. A razão para tal deriva de fatores externos e internos. O externo devia-se a várias acusações, tanto na Lituânia como na Polônia, de que os judeus eram proselitistas. Não sabemos se estas eram falsas acusações ou se realmente representavam uma atitude da comunidade. No campo interno, por sua vez, o mundo moderno fez recrudescer o desejo por fronteiras nítidas e definidas entre os membros do grupo dos judeus e os outros. A ameaça trazida pela emancipação, pela assimilação e pela miscigenação acabaram por produzir exigências cada vez mais estritas no que diz respeito à conversão. Mais recentemente, a volatilidade com que os indivíduos cruzam as fronteiras de tradições e culturas adicionou suspeita ao processo de conversão ao judaísmo.
É interessante notar que esta atitude mais severa com as conversões é de origem nitidamente ashkenazi. O mundo sefaradita até a poucas décadas agia de forma bastante pragmática para com a conversão, admitindo sua prática como uma necessidade intrínseca a um povo de "moradores e estrangeiros", como se sentiam os judeus.
TACH'LIS, NA PRÁTICA:
A rigidez na conversão e o abandono de atitudes mais pragmáticas são nitidamente um reflexo de sentimentos de insegurança e falta de controle sobre os destinos do judaísmo. É interessante notar que a literatura rabínica trata a questão da conversão com toda a sua riqueza e "diversidade". Não há a expectativa atual de uma fidelidade básica que seja absoluta. Fidelidades parciais eram também reconhecidas, o que demonstra grande interesse num tratamento mais pragmático. Vejamos os termos usados para distinguir as diversas atitudes dos conversos:
GER TOSHAV (prosélito residente)-- aquele que para adquirir cidadania limitada na Palestina, renunciava à idolatria. (Gitt. 57b)
GER SHEKER (prosélito insincero) - aquele que ocultava a preservação de costumes e crenças de sua fé de origem.
GER TSEDEK (prosélito justo) -- aquele que se convertia com conhecimento do judaísmo, com sinceridade e com compromisso.
GER G'ERURIM (um converso auto-realizado) - não formalmente admitido e convertido, mas que é recebido informalmente pela comunidade (Av. Zara 3b).
GER ARIOT (prosélito por medo) (Hull 3b) - aquele que é pressionado direta ou indiretamente para a conversão. O exemplo clássico é os "gerei Mordechai vê-Esther" -- conversos de Esther. (Esther VIII,17)
GER CHALOMOT (prosélito por sonho) - conversos por conselho místico, por sonho ou por interpretador de sonhos (San. 85b)
GERIN TO'IN (prosélitos em erro) - conversos que não seguem os direcionamentos do Judaísmo mesmo sem traí-los por outros preceitos. (Iev. 25a)
Após mais de uma década atuando como um rabino que realiza conversões como uma forma de conviver com fenômenos inerentes a realidade dos judeus do Brasil, posso distinguir todos os diferentes grupos definidos pelos rabinos do passado. Há os que se convertem de forma plena e são exemplos para os próprios judeus de um judaísmo vivo e com valores intrínsecos que muitos desconhecem. Há os que são apenas "residentes", convivendo bem com o judaísmo, mas não demonstram interesse intelectual ou espiritual pelo mesmo. São sinceros na sua adoção do judaísmo, criam seus filhos como judeus e acabam funcionando de forma semelhante a grande massa de judeus aculturados que, mesmo assim, preservam sua identidade e pertinência. Há os que se converteram por medo. Medo do cônjuge, ou da sogra, ou pressionados por seus próprios preconceitos ("a mulher deve seguir o marido") ou pelo desejo de penetração em grupos sociais judaicos. Há cada vez mais os "prosélitos por sonho", que fazem do misticismo um substituto para a falta de identidade própria. Há prosélitos mentirosos que manipulam o ato de conversão para a obtenção de favorecimentos AFETIVOS e mesmo MATERIAIS. Há os conversos em "erro", que diferente dos "residentes" que cumprem com práticas destituídas de paixão, não renegam o judaísmo apesar deste ter pouca presença em sua vida.
Esta variedade de casos mostra algo interessante: há diferentes tipos de guer. Eles não são apenas a categoria dos "justos", dos prosélitos absolutos, mas toda esta gama que mencionamos acima. Até mesmo o guer sheker - o prosélito mentiroso e manipulador - é um guer. É óbvio que se detectada a malícia, aqueles responsáveis pela conversão devem impedi-la. Mas é importante perceber que estes estilos de guer, só são conhecidos após o ato de conversão formal. Até este ato, todos os guerim terão que se apresentar como candidatos a ser guer tsedek (justos) ou no mínimo guer toshav (residentes). Este fenômeno é parecido a intervenção religiosa no casamento, por exemplo. Um casal pode estar se casando por amor e com plena consciência do significado de um casamento. Pode vir sem amor, pode vir para angariar proveitos materiais, pode vir só para cumprir a vontade dos pais, pode querer apenas uma casa afetiva que não tinha com os pais e assim por diante. Até que ponto o rabino deve interferir para que o casamento seja feito apenas entre um zug tsedek (um casal de justos)? Afinal a chupá é um compromisso nas esferas celestes, porque quereria um rabino envolver D'us numa situação que não fosse sempre "absoluta", certa e incontestável? Sabe porque? Porque não haveria casamentos.
É óbvio que em casos patéticos onde processos maliciosos sejam detectados por um rabino, este deveria se envolver até o ponto de se negar a oficiar "tal casamento". Recordo-me de um casal de "crianças", ambos com 18 anos que me procuraram para realizar seu casamento.
Tinham certeza do que queriam e tinham a benção de seus pais. Na conversa com ambos fiquei impressionado por sua imaturidade e, por meus parâmetros, eles não deveriam se casar pelo menos naquele momento. Ao questiona-los em vários aspectos vi que estavam seguros de seu desejo. Por instantes saí de minha sala para refletir pois estava confuso: qual era o meu papel? Seu desejo era genuíno por razões que eu julgava erradas. Mas quem era eu para querer controlar o futuro? Acaso o próprio erro não pode ser o caminho escolhido por alguém? Sabe-se lá qual a função que o erro (admitindo-se que eu tinha razão) teria na vida destas pessoas? Como diz um ditado judaico: "Nunca retire o fardo das costas de uma pessoa porque você não sabe a função que este pode ter. Ajude-a sim com o fardo, ajude-a a reconhecer que há outras maneiras de lidar com o fardo, mas não o remova por julgamento seu."
Eu fiz este casamento como faria o casamento de um casal no qual um dos cônjuges estivesse buscando vantagens materiais (casamento sheker - insincero) desde que dentro de minhas possibilidades tivesse feito tudo o que julgasse ético para advertir o outro cônjuge de uma possível malícia envolvida. Mas se este tomasse a decisão de prosseguir com o mesmo, não me caberia outra coisa a não ser realizar este casamento.
E destas uniões já surgiram muitas bênçãos, mesmo porque as bênçãos não são produto de acertos momentâneos que determinam destinos. As bênçãos são produtos da interação constante dos indivíduos com a sua vida. A incerteza está presente em todas as certezas e não reconhecer isto é querer impor-se ao futuro. Nossa responsabilidade inclui também compreender a partir de onde não somos responsáveis.
Retornando as conversões, acredito que é fundamental seriedade e compromisso nessa questão. Desafio no Brasil algum processo de conversão que exija tanto comprometimento de tempo, participação, doação, questionamento emocional, intelectual e espiritual quanto o que realizamos na CJB. No entanto produzimos todos os tipos de guerim descritos acima. Repito, não os produzimos sem a exigência de ser guerei tsedek (justos) e muitos (uma quantidade gratificante) se torna, mas também todos os demais tipos se revelam com o passar do tempo.
Há conversos justos que não produzirão uma continuidade judaica e há conversos mentirosos que nos trarão Rabi Akivas e Rabi Meirs. O problema não são os conversos, o problema são os judeus. Qual é o judaísmo que os judeus acreditam e querem praticar? Somente este pode ser o judaísmo exigido daqueles que querem ser judeus. Alguns têm proposto uma conversão que seja não-religiosa, o que parece, a primeira vista, maravilhoso. Eu adoraria que todos os demais guerim que não fossem tsedek (justos), que não quisessem ser judeus observantes, se dirigissem a um cartório ou a um consulado que faria a sua conversão civil. Mas, muito menos por uma questão de poder ou interesse rabínico, percebo que isto é um engodo.
Da mesma forma que acredito num casamento religioso não só para os observantes do judaísmo, mas vejo neste ato de casamento religioso uma forma em si de observância, imagino o mesmo para as conversões. Acredito que o judaísmo não é apenas uma cidadania civil e que em sua complexidade contém as tradições, os rituais, o folclore e o misticismo.
Não contemplar as conversões num ambiente que inclua tudo isto é abrir mão do que acredito.
O custo é o mais difícil que existe para um mortal: reconhecer que não se tem controle sob processos desta ordem. Vou continuar a realizar conversões que tenham a qualidade de gerar guerei tsedek (conversos justos), mas vou produzir todo o tipo de guerim. Eu e todos os rabinos, sejam de que orientação forem. Mas se há custos, há benefícios também em não se controlar processos. E isto diz respeito às surpresas e às bênçãos inesperadas.
Não me considero proselitista nem para os não-judeus e nem para os judeus. Na verdade não acredito no convencimento. Mas o desejo do outro e a intenção do outro eu respeito até provado o contrário. Mas a dignidade de um judaísmo sem medo, sem segregação e receptivo eu acredito.
Realmente a questão das conversões não deveriam estar na agenda nem da Ortodoxia nem dos judeus assimilados. Para os diferentes é difícil "produzir" diferentes. Para os que não precisam de qualquer convenção da linguagem e da liturgia, para iguais absolutos, é perda de tempo.
Mas para todos aqueles que se sentem como iguais e ao mesmo tempo identificados com costumes, práticas e tradições de uma cultura e de visão de mundo específica, fronteiras sempre existirão. Não existirão como barreiras mas como forma e como especificidade. A abertura destas fronteiras é fundamental para sua existência destas fronteiras em nossos dias.
Como a pele que nos dá identidade e delimita o nosso corpo, sua porosidade é nada menos do que vital.

A questão das conversões ao judaísmo, mais do que polêmicas entre os diversos movimentos judaicos, revela importantes tendências da auto-imagem dos judeus nos últimos séculos. A freqüente desconfiança dos judeus quanto à sinceridade dos conversos se baseia em parte no temor da corrosão pela assimilação e em parte pelo temor de utilização do judaísmo para "interesses próprios". Ambas considerações são relatadas desde os primeiros textos rabínicos sobre o assunto. Há, no entanto, um terceiro elemento de caráter bastante subjetivo e que é uma "fresh mutation", um desenvolvimento moderno da questão.
Diz respeito à evolução da idéia de que "ser judeu" é uma condição transmissível apenas pelo "sangue". Para colocar em linguagem contextualizada, não estamos falando de uma carga genética, terminologia muito recente, mas de uma "alma" que retrocede até o Monte Sinai. Este pedigree espiritual consiste numa forma de racismo que se expressa pela crença não de um corpo diferenciado, mas de uma alma diferenciada. Mais popularmente, essa forma de teologia ocupa o imaginário como sendo "impossível para um não-judeu entender o drama, a tragédia, a saga e a epopéia do judaísmo". Só uma "alma" moldada pela experiência histórica e amamentada por um "lar judaico" consegue produzir o "ser judeu".
Vamos fazer um passeio pelo conceito da "conversão" com o intuito de deixar exposta uma insegurança interna dos judeus que se manifesta externamente na questão da conversão. A possível falta de fidelidade do converso, sua capacidade de inocular o judaísmo de percepções errôneas, ou o seu potencial de diluir algo que é puro, revelam a fragilidade da identidade judaica moderna. É insuportável à grande massa de judeus não praticantes e absorvidos pela cidadania e pela globalização perceber que há pouca, quase nenhuma ou nenhuma diferença entre eles e os não judeus. Aumentar o valor do título para preservar a qualidade do clube, sem uma real benfeitoria no conteúdo e na qualidade do mesmo, é indicativo de decadência. Aparentemente resolvidos estariam os extremos - a ortodoxia e os judeus plenamente assimilados. O primeiro assume ser "diferente" dos outros seja em sua missão histórica ou, sob forma mística, em sua função cósmica. O segundo assume ser "um igual" e, portanto, questões como a conversão ou convenções de pertencimento pouco importam.
No entanto, ambas as posturas apenas dissimulam uma resolução definitiva. A ortodoxia, primeiramente, vive seu drama particular tendo que adotar posturas cada vez mais radicais de diferença num mundo de iguais. Não só a televisão fala de iguais, mas a moral, a ética, a cultura, a arte, a ciência, os mitos e os misticismos. A ortodoxia usufrui desta igualdade, depende desta igualdade, faz uso dela e precisa, ao mesmo tempo, constantemente se re-assegurar de que ela não existe. A vestimenta, as práticas e as idéias têm como função maior não tanto servir ao Criador, mas proteger o judeu. O segundo grupo, assume ares de resolvido para descobrir na primeira ou segunda geração que seus descendentes tornam-se confusos, não identificando em sua postura uma opção comunitária, mas uma desistência.
A palavra "guer" - converso - aparece no texto bíblico com o sentido de "estrangeiro". Sua raiz de significado "residir, habitar", transmite uma sensação de transitoriedade. "Moradores temporários vocês foram no Egito" diz o texto bíblico gerando uma das mais fortes identificações judaicas - vocês foram estrangeiros, vocês foram moradores temporários sentados sobre suas malas e vocês foram "conversos" em meio a outros. Não há dúvida que a expressão contém uma dubiedade. Se o converso é alguém que abraça uma cultura e uma fé, porque designa-lo para sempre como um "estrangeiro"?
Esta ambigüidade aparece nos textos em afirmações como "o converso é recebido de braços abertos e é tratado como um judeu" (Lev. R. 2:9) ou em discussões como a de se pode servir como juiz ou não ("um prosélito só pode servir como juiz em casos civis estando impedido de servir em casos criminais e, mesmo assim apenas para outro prosélito" - Iev. 102a).
Em certos casos a questão é de sensibilidade à diferença. Marcar a realidade de uma origem e de uma família externa ao judaísmo também aparece em discussões do tipo: "Como deve um converso se dirigir aos ancestrais judaicos? Nas orações deveria o converso dizer "Nosso D'us e D'us dos seus antepassados" ou "Nosso D'us e D'us de nossos antepassados"?". A pergunta é legítima do ponto de vista objetivo. Dizer que é o D'us de seus antepassados (tomando obviamente "D'us" por uma forma específica de relação com D'us) seria uma mentira. No entanto, Maimônides percebe a malícia implícita nesta "verdade" e sentencia em carta a um amigo convertido (Rambam, Responsa 42- ed. Freiman) "um converso deve dizer 'Nosso D'us e D'us de nossos ancestrais' ou 'que nos escolheu' ou 'que nos deu' ou 'que nos fez herdar', porque ao escolher se tornar um converso passou a ser um discípulo, um filho, de Abraão. Uma vez que se converte não há diferença entre eu e você...".
Na verdade, nenhuma outra tradição é tão marcada pela idéia de conversão como a judaica.
Seu fundador não é um profeta, um visionário que recebe importantes revelações, mas alguém que se associa a outro pacto diferente daquele de seus pais e de sua origem. Abraão é um personagem distinto de Moisés, de Buda, de Jesus ou mesmo de Maomé. Abraão é um converso que gradativamente converte também a sua mulher e as mulheres de seu filho e de seus netos.
Não só a tradição traça a origem de importantes personalidades como Rabi Akiva, Rabi Meir, Shemaia e Avtalion à conversões, mas os aponta como descendentes dos perversos Sancheriv, Sisera, Haman e Nero (Git. 56b). Isto demonstraria que a conversão é um ato de "nascimento" novo, independente do passado, seja do individuo ou de sua ancestralidade.
Simbolicamente isto se expressa pelo fato de ser o Messias descendente de conversos. Ruth a moabita, faz parte da linhagem direta do Rei David, o qual por sua vez é ancestral do Messias. Em resumo, Abraão é um converso, Moisés é um judeu que retorna e casa-se com uma não judia, Rabi Akiva é descendente de conversos e o Messias idem. Não há dúvida alguma que nos traços que hoje identificamos como tipicamente judeus - peles claras, meninos sardentos, ruivos, caucasianos, olhos claros e etc - há presença de misturas exógenas basicamente em todas as famílias. Poucos povos podem traçar tão diretamente sua origem a guerim, a estrangeiros, que passaram a morar, habitar, conviver e comportar-se com e como judeus.
O processo de dificultar as conversões assumindo aspectos cada vez mais rígidos, são bastante modernos. No século XVII, os conselhos judaicos da Lituânia e Moravia impuseram severas penalidades para o ato de proselitismo e para guarida oferecida a conversos. A razão para tal deriva de fatores externos e internos. O externo devia-se a várias acusações, tanto na Lituânia como na Polônia, de que os judeus eram proselitistas. Não sabemos se estas eram falsas acusações ou se realmente representavam uma atitude da comunidade. No campo interno, por sua vez, o mundo moderno fez recrudescer o desejo por fronteiras nítidas e definidas entre os membros do grupo dos judeus e os outros. A ameaça trazida pela emancipação, pela assimilação e pela miscigenação acabaram por produzir exigências cada vez mais estritas no que diz respeito à conversão. Mais recentemente, a volatilidade com que os indivíduos cruzam as fronteiras de tradições e culturas adicionou suspeita ao processo de conversão ao judaísmo.
É interessante notar que esta atitude mais severa com as conversões é de origem nitidamente ashkenazi. O mundo sefaradita até a poucas décadas agia de forma bastante pragmática para com a conversão, admitindo sua prática como uma necessidade intrínseca a um povo de "moradores e estrangeiros", como se sentiam os judeus.
TACH'LIS, NA PRÁTICA:
A rigidez na conversão e o abandono de atitudes mais pragmáticas são nitidamente um reflexo de sentimentos de insegurança e falta de controle sobre os destinos do judaísmo. É interessante notar que a literatura rabínica trata a questão da conversão com toda a sua riqueza e "diversidade". Não há a expectativa atual de uma fidelidade básica que seja absoluta. Fidelidades parciais eram também reconhecidas, o que demonstra grande interesse num tratamento mais pragmático. Vejamos os termos usados para distinguir as diversas atitudes dos conversos:
GER TOSHAV (prosélito residente)-- aquele que para adquirir cidadania limitada na Palestina, renunciava à idolatria. (Gitt. 57b)
GER SHEKER (prosélito insincero) - aquele que ocultava a preservação de costumes e crenças de sua fé de origem.
GER TSEDEK (prosélito justo) -- aquele que se convertia com conhecimento do judaísmo, com sinceridade e com compromisso.
GER G'ERURIM (um converso auto-realizado) - não formalmente admitido e convertido, mas que é recebido informalmente pela comunidade (Av. Zara 3b).
GER ARIOT (prosélito por medo) (Hull 3b) - aquele que é pressionado direta ou indiretamente para a conversão. O exemplo clássico é os "gerei Mordechai vê-Esther" -- conversos de Esther. (Esther VIII,17)
GER CHALOMOT (prosélito por sonho) - conversos por conselho místico, por sonho ou por interpretador de sonhos (San. 85b)
GERIN TO'IN (prosélitos em erro) - conversos que não seguem os direcionamentos do Judaísmo mesmo sem traí-los por outros preceitos. (Iev. 25a)
Após mais de uma década atuando como um rabino que realiza conversões como uma forma de conviver com fenômenos inerentes a realidade dos judeus do Brasil, posso distinguir todos os diferentes grupos definidos pelos rabinos do passado. Há os que se convertem de forma plena e são exemplos para os próprios judeus de um judaísmo vivo e com valores intrínsecos que muitos desconhecem. Há os que são apenas "residentes", convivendo bem com o judaísmo, mas não demonstram interesse intelectual ou espiritual pelo mesmo. São sinceros na sua adoção do judaísmo, criam seus filhos como judeus e acabam funcionando de forma semelhante a grande massa de judeus aculturados que, mesmo assim, preservam sua identidade e pertinência. Há os que se converteram por medo. Medo do cônjuge, ou da sogra, ou pressionados por seus próprios preconceitos ("a mulher deve seguir o marido") ou pelo desejo de penetração em grupos sociais judaicos. Há cada vez mais os "prosélitos por sonho", que fazem do misticismo um substituto para a falta de identidade própria. Há prosélitos mentirosos que manipulam o ato de conversão para a obtenção de favorecimentos AFETIVOS e mesmo MATERIAIS. Há os conversos em "erro", que diferente dos "residentes" que cumprem com práticas destituídas de paixão, não renegam o judaísmo apesar deste ter pouca presença em sua vida.
Esta variedade de casos mostra algo interessante: há diferentes tipos de guer. Eles não são apenas a categoria dos "justos", dos prosélitos absolutos, mas toda esta gama que mencionamos acima. Até mesmo o guer sheker - o prosélito mentiroso e manipulador - é um guer. É óbvio que se detectada a malícia, aqueles responsáveis pela conversão devem impedi-la. Mas é importante perceber que estes estilos de guer, só são conhecidos após o ato de conversão formal. Até este ato, todos os guerim terão que se apresentar como candidatos a ser guer tsedek (justos) ou no mínimo guer toshav (residentes). Este fenômeno é parecido a intervenção religiosa no casamento, por exemplo. Um casal pode estar se casando por amor e com plena consciência do significado de um casamento. Pode vir sem amor, pode vir para angariar proveitos materiais, pode vir só para cumprir a vontade dos pais, pode querer apenas uma casa afetiva que não tinha com os pais e assim por diante. Até que ponto o rabino deve interferir para que o casamento seja feito apenas entre um zug tsedek (um casal de justos)? Afinal a chupá é um compromisso nas esferas celestes, porque quereria um rabino envolver D'us numa situação que não fosse sempre "absoluta", certa e incontestável? Sabe porque? Porque não haveria casamentos.
É óbvio que em casos patéticos onde processos maliciosos sejam detectados por um rabino, este deveria se envolver até o ponto de se negar a oficiar "tal casamento". Recordo-me de um casal de "crianças", ambos com 18 anos que me procuraram para realizar seu casamento.
Tinham certeza do que queriam e tinham a benção de seus pais. Na conversa com ambos fiquei impressionado por sua imaturidade e, por meus parâmetros, eles não deveriam se casar pelo menos naquele momento. Ao questiona-los em vários aspectos vi que estavam seguros de seu desejo. Por instantes saí de minha sala para refletir pois estava confuso: qual era o meu papel? Seu desejo era genuíno por razões que eu julgava erradas. Mas quem era eu para querer controlar o futuro? Acaso o próprio erro não pode ser o caminho escolhido por alguém? Sabe-se lá qual a função que o erro (admitindo-se que eu tinha razão) teria na vida destas pessoas? Como diz um ditado judaico: "Nunca retire o fardo das costas de uma pessoa porque você não sabe a função que este pode ter. Ajude-a sim com o fardo, ajude-a a reconhecer que há outras maneiras de lidar com o fardo, mas não o remova por julgamento seu."
Eu fiz este casamento como faria o casamento de um casal no qual um dos cônjuges estivesse buscando vantagens materiais (casamento sheker - insincero) desde que dentro de minhas possibilidades tivesse feito tudo o que julgasse ético para advertir o outro cônjuge de uma possível malícia envolvida. Mas se este tomasse a decisão de prosseguir com o mesmo, não me caberia outra coisa a não ser realizar este casamento.
E destas uniões já surgiram muitas bênçãos, mesmo porque as bênçãos não são produto de acertos momentâneos que determinam destinos. As bênçãos são produtos da interação constante dos indivíduos com a sua vida. A incerteza está presente em todas as certezas e não reconhecer isto é querer impor-se ao futuro. Nossa responsabilidade inclui também compreender a partir de onde não somos responsáveis.
Retornando as conversões, acredito que é fundamental seriedade e compromisso nessa questão. Desafio no Brasil algum processo de conversão que exija tanto comprometimento de tempo, participação, doação, questionamento emocional, intelectual e espiritual quanto o que realizamos na CJB. No entanto produzimos todos os tipos de guerim descritos acima. Repito, não os produzimos sem a exigência de ser guerei tsedek (justos) e muitos (uma quantidade gratificante) se torna, mas também todos os demais tipos se revelam com o passar do tempo.
Há conversos justos que não produzirão uma continuidade judaica e há conversos mentirosos que nos trarão Rabi Akivas e Rabi Meirs. O problema não são os conversos, o problema são os judeus. Qual é o judaísmo que os judeus acreditam e querem praticar? Somente este pode ser o judaísmo exigido daqueles que querem ser judeus. Alguns têm proposto uma conversão que seja não-religiosa, o que parece, a primeira vista, maravilhoso. Eu adoraria que todos os demais guerim que não fossem tsedek (justos), que não quisessem ser judeus observantes, se dirigissem a um cartório ou a um consulado que faria a sua conversão civil. Mas, muito menos por uma questão de poder ou interesse rabínico, percebo que isto é um engodo.
Da mesma forma que acredito num casamento religioso não só para os observantes do judaísmo, mas vejo neste ato de casamento religioso uma forma em si de observância, imagino o mesmo para as conversões. Acredito que o judaísmo não é apenas uma cidadania civil e que em sua complexidade contém as tradições, os rituais, o folclore e o misticismo.
Não contemplar as conversões num ambiente que inclua tudo isto é abrir mão do que acredito.
O custo é o mais difícil que existe para um mortal: reconhecer que não se tem controle sob processos desta ordem. Vou continuar a realizar conversões que tenham a qualidade de gerar guerei tsedek (conversos justos), mas vou produzir todo o tipo de guerim. Eu e todos os rabinos, sejam de que orientação forem. Mas se há custos, há benefícios também em não se controlar processos. E isto diz respeito às surpresas e às bênçãos inesperadas.
Não me considero proselitista nem para os não-judeus e nem para os judeus. Na verdade não acredito no convencimento. Mas o desejo do outro e a intenção do outro eu respeito até provado o contrário. Mas a dignidade de um judaísmo sem medo, sem segregação e receptivo eu acredito.
Realmente a questão das conversões não deveriam estar na agenda nem da Ortodoxia nem dos judeus assimilados. Para os diferentes é difícil "produzir" diferentes. Para os que não precisam de qualquer convenção da linguagem e da liturgia, para iguais absolutos, é perda de tempo.
Mas para todos aqueles que se sentem como iguais e ao mesmo tempo identificados com costumes, práticas e tradições de uma cultura e de visão de mundo específica, fronteiras sempre existirão. Não existirão como barreiras mas como forma e como especificidade. A abertura destas fronteiras é fundamental para sua existência destas fronteiras em nossos dias.
Como a pele que nos dá identidade e delimita o nosso corpo, sua porosidade é nada menos do que vital.
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Conversões
31 de agosto de 2008
As opiniões de Dellapergola, demógrafo do povo judeu
Por: Ariel Finguerman, de Jerusalém
"Questão demográfica": eis um assunto que tira o sono de muitos judeus em Israel e no mundo. Aliás é mais de uma questão, mas várias ao mesmo tempo. O que acontecerá em Israel daqui a dez anos quando houver mais árabes que judeus entre o Jordão e o Mediterrâneo? A assimilação está acabando com o judaísmo no mundo? Por que a comunidade no Brasil diminui? Relaxar as exigências nas conversões é solução para aumentar o povo judeu?
Sergio Dellapergola, 61 anos, professor de origem italiana da Universidade de Jerusalém conhecido como "o demógrafo do povo judeu" é o melhor para responder a estas perguntas. Dellapergola conhece este assunto muito bem: ele visitou todas as comunidades judaicas deste planeta com mais de 25 mil pessoas, "menos a Austrália", disse o simpático professor à Hebraica.
O interesse de Dellapergola por demografia judaica começou quando ainda era estudante e membro de movimento juvenil e fez uma pequena pesquisa sobre a comunidade de Milão. Apaixonou-se pelo tema e, de lá para cá, já publicou mais de cem trabalhos e ensinou em quarenta universidades e institutos ao redor do mundo. Hoje, ele é um dos diretores do Instituto de Planejamento de Políticas para o Povo Judeu, em Jerusalém, onde ele deu a seguinte entrevista
Hebraica – Hoje, em Israel, cada vez mais vozes alertam que por volta de 2013 haverá mais árabes que judeus entre o Jordão e o Mediterrâneo. Mas há dois dias, Ariel Sharon declarou que não está preocupado pois confia numa grande aliá nos próximos anos. Como o senhor vê esta situação?
Dellapergola – O premiê Sharon espera um milhão de novos imigrantes. Mas de onde eles virão? Hoje a maioria dos judeus vive nos países ocidentais, nos EUA, na Austrália e na Europa. Nesses lugares o nível de desenvolvimento é alto e pouca a discriminação contra os judeus. Por que viriam para um país de nível de vida mais baixo e mais insegurança política? Outra condição para haver imigração seria a estabilização do Oriente Médio e acontecer um novo boom econômico, situação que não ocorre hoje.
Hebraica – O que acontecerá quando houver aqui uma maioria árabe?
Dellapergola – Chegaremos a uma situação inaceitável para aqueles que sonharam com um Estado judeu. Teremos então algumas alternativas. Poderemos manter 4,7 milhões de árabes sem direitos civis ou transferi-los para a Jordânia, que são duas idéias inaceitáveis. A terceira alternativa é dividir o território em dois Estados, um judeu e um árabe.
Hebraica – Hoje Israel já é um dos países mais povoados do mundo, descontado o deserto do Negev. Haverá lugar para acomodar mais habitantes?
Dellapergola – Na década de 20 viviam aqui um milhão de pessoas e já se perguntava qual seria a capacidade da região. Segundo alguns, o máximo seria 2,5 milhões, outros falavam em 10 milhões. Pois bem, hoje já somos 10 milhões, entre israelenses e palestinos. E a pergunta continua.
Hebraica – Qual é a capacidade máxima, em sua opinião?
Dellapergola – Se tudo continuar como está hoje, no ano 2050 seremos 36 milhões de pessoas entre o Jordão e o Mediterrâneo. Será possível viver? Será um pesadelo? Dependerá da tecnologia disponível, da habilidade de organizar o território e de prover recursos essenciais como água e ar puro. Veja o caso da cidade de Beer-Sheva, onde vivem hoje 300 mil pessoas. Compare esta região com Phoenix, no Arizona, uma cidade muito parecida e onde vivem 3 milhões de pessoas. Acho que poderíamos facilmente acomodar um número semelhante de habitantes em Beer-Sheva.
Hebraica – O atual governo constrói um muro entre Israel e os palestinos. No começo, a idéia era separar as duas populações, mas a barreira entrou pela Cisjordânia e incorporou milhares de árabes.
Dellapergola – O muro deveria servir apenas como medida de segurança e não para incorporar territórios. Muitas mudanças [no traçado da Linha Verde] trarão judeus para dentro de Israel, mas também muitos árabes sem resolver nada. Sou favorável a incorporar o máximo de judeus dentro de Israel, mesmo que para isto tenhamos que abrir mão de territórios. Sou a favor de trocar terras que hoje fazem parte de Israel mas com maioria árabe, como regiões da Galiléia, por territórios palestinos onde há presença judaica, como nas áreas ao redor de Jerusalém.
Hebraica – Há em Israel uma verdadeira angústia quanto aos cidadãos árabes do país e o temor de que sua população vai crescer a ponto de ameaçar o caráter judaico da nação. Este medo é justificado?
Dellapergola – Sabemos que os árabes israelenses de regiões da Galiléia não gostam da bandeira de Israel e é a bandeira palestina que tremula em suas escolas e mesquitas. É uma situação anormal, pois embora cidadãos de um Estado sua lealdade é para com outra nação. Este é um fator gerador de conflito que pode ser solucionado de forma positiva por meio da partilha da terra entre os dois povos.
Hebraica – Alguns especialistas dizem que Israel é incapaz de absorver os mais de 200 mil árabes de Jerusalém Oriental e só isto já seria uma razão para dividir a cidade. Qual sua opinião?
Dellapergola – Um acordo de paz levará à existência de duas cidades dentro de Jerusalém. Mas sou totalmente contra barreiras e muros. Veja o caso de Beverly Hills e Los Angeles: são duas cidades com diferentes prefeitos, policiais e bombeiros, mas ninguém sabe onde termina uma e começa a outra. Esta poderia ser também uma fórmula para Jerusalém. Israel incorporou toda a cidade, ofereceu cidadania aos árabes de Jerusalém, mas poucos aceitaram. Eu pessoalmente reconsideraria esta situação e estaria pronto a transferir a jurisdição sobre esta população a um futuro Estado palestino, incluindo a soberania sobre a parte oriental da cidade. Isto por razões demográficas, políticas e culturais.
Hebraica – Afinal, quantos judeus vivem no Brasil?
Dellapergola – O censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Ibge) é muito bem feito e, segundo o qual, há pouco menos de 100 mil judeus no Brasil. Esta também é a minha avaliação. Também sabemos que metade dos judeus brasileiros vive em São Paulo.
Hebraica – Qual a tendência demográfica dos judeus brasileiros?
Dellapergola – Como quase todas as comunidades judaicas da Diáspora, o número de nascimentos entre os judeus brasileiros é bastante baixo. Mais pessoas morrem na comunidade do que nascem. Também, como o Brasil tem uma tradição multicultural, há muitos casamentos mistos e bastante assimilação. O número de judeus brasileiros tende a diminuir, mas não é algo dramático. Podemos até considerar a população judaica do Brasil estável, se compararmos com outras comunidades do mundo.
Hebraica – Existe um dito bastante difundido entre os judeus que diz: "Os casamentos mistos e a assimilação estão fazendo o que Hitler não conseguiu".
Dellapergola – Não gosto do estilo desta afirmação. É preciso separar demografia de um lado e Holocausto do outro. Hitler não tem nada a ver com casamentos mistos. No entanto, é fato que na maior parte das comunidades da Diáspora, somente uma pequena parcela dos filhos de casamentos mistos acaba afiliada ao judaísmo. A maioria termina por aderir à religião da maioria do país.
Hebraica – Também há vozes, especialmente nos Estados Unidos, defendendo um maior relaxamento das leis de conversão para aumentar o número de judeus. Isto poderia ser uma solução?
Dellapergola – Segundo algumas pesquisas, os filhos de casamentos mistos tendem a se casar com não-judeus numa proporção ainda maior que a média da comunidade. Isto acontece também com crianças produtos desses casamentos e que foram criadas como judias. Isto mostra que elas não são suficientemente motivadas, não recebem o conhecimento necessário sobre o que significa pertencer a uma comunidade judaica. Uma conclusão disto tudo é que um rito de admissão ao judaísmo que seja brando e não tenha um mínimo de requisitos, só terá um forte impacto a curto prazo. As comunidades judaicas receberão novas pessoas, mas elas também tenderão a sair bastante rápido. Abaixar as exigências não garantirá a expansão da comunidade a longo prazo.
Hebraica – A Bíblia diz que somos, numericamente, o menor de todos os povos. Continuaremos sendo assim no futuro?
Dellapergola – A Bíblia também ordena que nos multipliquemos e diz que um dia seremos tantos quanto o pó da terra. Assim, nosso nível populacional está condicionado ao nosso comportamento. Segundo a Torá, se nos comportarmos devidamente, seremos numerosos. Do contrário, perderemos tudo. Isto é o que está escrito.
A demografia política:
O que acontecerá quando a população árabe ultrapassar o número de judeus entre o Jordão e o Mediterrâneo, daqui a dez anos? Leia algumas opiniões:
"Nós não temos tempo ilimitado. Mais e mais palestinos estão ficando desinteressados numa solução negociada para se chegar a dois Estados. Porque eles querem transformar a essência do conflito num modelo sul-africano [apartheid]. De uma luta contra a ‘ocupação’ querem mudar para uma luta por ‘um homem um voto’. Esta será uma luta muito mais limpa e, no final das contas, também mais poderosa. Para nós, significará o fim do Estado judeu."Ehud Olmert, ministro da Indústria, do Trabalho e das Comunicações do governo do Likud
"O que realmente me dá medo é o dia, não muito distante, em que nascerá o bebê palestino que transformará os judeus deste lugar numa minoria. Então o que faremos? Como serão as coisas quando não tivermos mais a desculpa e a força de sermos a maioria? Acho que toda geração tem uma verdade, e a verdade da nossa geração é que entre o Jordão e o Mediterrâneo os judeus se tornarão minoria."Avraham Burg, um dos líderes do Partido Trabalhista
"Quanto mais rápido chegarmos a uma situação em que houver dois Estados com fronteiras razoáveis, com acordos de segurança razoáveis e com um relacionamento razoável, melhor será para resolver a questão demográfica. Isto ajudará pelo menos a reduzir a ameaça do conflito se tornar existencial para os dois povos."Dan Kurtzer, embaixador (judeu) dos EUA em Israel
OS JUDEUS E NÚMEROS:
Hoje somos quase 13 milhões.
De cada 480 seres humanos na Terra, 1 é judeu.
Os EUA têm a maior comunidade judaica (5,3 milhões),
seguidos de Israel (5 milhões) e da França (500 mil).
No Brasil vivem pouco menos de 100 mil judeus.
Hoje, os judeus representam 81% da população de Israel dentro da Linha Verde, mas em 2050 esta porcentagem cairá para 74%.
Atualmente cerca de 760 mil israelenses vivem fora do país.
A comunidade judaica da Rússia tem a maior porcentagem de casamentos mistos (78%), comparada com os judeus dos EUA (51%) e da França (40%).
Fonte: Sergio Dellapergola; jornal Haaretz
* Matéria Extraída da Revista "A HEBRAICA"
"Questão demográfica": eis um assunto que tira o sono de muitos judeus em Israel e no mundo. Aliás é mais de uma questão, mas várias ao mesmo tempo. O que acontecerá em Israel daqui a dez anos quando houver mais árabes que judeus entre o Jordão e o Mediterrâneo? A assimilação está acabando com o judaísmo no mundo? Por que a comunidade no Brasil diminui? Relaxar as exigências nas conversões é solução para aumentar o povo judeu?
Sergio Dellapergola, 61 anos, professor de origem italiana da Universidade de Jerusalém conhecido como "o demógrafo do povo judeu" é o melhor para responder a estas perguntas. Dellapergola conhece este assunto muito bem: ele visitou todas as comunidades judaicas deste planeta com mais de 25 mil pessoas, "menos a Austrália", disse o simpático professor à Hebraica.
O interesse de Dellapergola por demografia judaica começou quando ainda era estudante e membro de movimento juvenil e fez uma pequena pesquisa sobre a comunidade de Milão. Apaixonou-se pelo tema e, de lá para cá, já publicou mais de cem trabalhos e ensinou em quarenta universidades e institutos ao redor do mundo. Hoje, ele é um dos diretores do Instituto de Planejamento de Políticas para o Povo Judeu, em Jerusalém, onde ele deu a seguinte entrevista
Hebraica – Hoje, em Israel, cada vez mais vozes alertam que por volta de 2013 haverá mais árabes que judeus entre o Jordão e o Mediterrâneo. Mas há dois dias, Ariel Sharon declarou que não está preocupado pois confia numa grande aliá nos próximos anos. Como o senhor vê esta situação?
Dellapergola – O premiê Sharon espera um milhão de novos imigrantes. Mas de onde eles virão? Hoje a maioria dos judeus vive nos países ocidentais, nos EUA, na Austrália e na Europa. Nesses lugares o nível de desenvolvimento é alto e pouca a discriminação contra os judeus. Por que viriam para um país de nível de vida mais baixo e mais insegurança política? Outra condição para haver imigração seria a estabilização do Oriente Médio e acontecer um novo boom econômico, situação que não ocorre hoje.
Hebraica – O que acontecerá quando houver aqui uma maioria árabe?
Dellapergola – Chegaremos a uma situação inaceitável para aqueles que sonharam com um Estado judeu. Teremos então algumas alternativas. Poderemos manter 4,7 milhões de árabes sem direitos civis ou transferi-los para a Jordânia, que são duas idéias inaceitáveis. A terceira alternativa é dividir o território em dois Estados, um judeu e um árabe.
Hebraica – Hoje Israel já é um dos países mais povoados do mundo, descontado o deserto do Negev. Haverá lugar para acomodar mais habitantes?
Dellapergola – Na década de 20 viviam aqui um milhão de pessoas e já se perguntava qual seria a capacidade da região. Segundo alguns, o máximo seria 2,5 milhões, outros falavam em 10 milhões. Pois bem, hoje já somos 10 milhões, entre israelenses e palestinos. E a pergunta continua.
Hebraica – Qual é a capacidade máxima, em sua opinião?
Dellapergola – Se tudo continuar como está hoje, no ano 2050 seremos 36 milhões de pessoas entre o Jordão e o Mediterrâneo. Será possível viver? Será um pesadelo? Dependerá da tecnologia disponível, da habilidade de organizar o território e de prover recursos essenciais como água e ar puro. Veja o caso da cidade de Beer-Sheva, onde vivem hoje 300 mil pessoas. Compare esta região com Phoenix, no Arizona, uma cidade muito parecida e onde vivem 3 milhões de pessoas. Acho que poderíamos facilmente acomodar um número semelhante de habitantes em Beer-Sheva.
Hebraica – O atual governo constrói um muro entre Israel e os palestinos. No começo, a idéia era separar as duas populações, mas a barreira entrou pela Cisjordânia e incorporou milhares de árabes.
Dellapergola – O muro deveria servir apenas como medida de segurança e não para incorporar territórios. Muitas mudanças [no traçado da Linha Verde] trarão judeus para dentro de Israel, mas também muitos árabes sem resolver nada. Sou favorável a incorporar o máximo de judeus dentro de Israel, mesmo que para isto tenhamos que abrir mão de territórios. Sou a favor de trocar terras que hoje fazem parte de Israel mas com maioria árabe, como regiões da Galiléia, por territórios palestinos onde há presença judaica, como nas áreas ao redor de Jerusalém.
Hebraica – Há em Israel uma verdadeira angústia quanto aos cidadãos árabes do país e o temor de que sua população vai crescer a ponto de ameaçar o caráter judaico da nação. Este medo é justificado?
Dellapergola – Sabemos que os árabes israelenses de regiões da Galiléia não gostam da bandeira de Israel e é a bandeira palestina que tremula em suas escolas e mesquitas. É uma situação anormal, pois embora cidadãos de um Estado sua lealdade é para com outra nação. Este é um fator gerador de conflito que pode ser solucionado de forma positiva por meio da partilha da terra entre os dois povos.
Hebraica – Alguns especialistas dizem que Israel é incapaz de absorver os mais de 200 mil árabes de Jerusalém Oriental e só isto já seria uma razão para dividir a cidade. Qual sua opinião?
Dellapergola – Um acordo de paz levará à existência de duas cidades dentro de Jerusalém. Mas sou totalmente contra barreiras e muros. Veja o caso de Beverly Hills e Los Angeles: são duas cidades com diferentes prefeitos, policiais e bombeiros, mas ninguém sabe onde termina uma e começa a outra. Esta poderia ser também uma fórmula para Jerusalém. Israel incorporou toda a cidade, ofereceu cidadania aos árabes de Jerusalém, mas poucos aceitaram. Eu pessoalmente reconsideraria esta situação e estaria pronto a transferir a jurisdição sobre esta população a um futuro Estado palestino, incluindo a soberania sobre a parte oriental da cidade. Isto por razões demográficas, políticas e culturais.
Hebraica – Afinal, quantos judeus vivem no Brasil?
Dellapergola – O censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Ibge) é muito bem feito e, segundo o qual, há pouco menos de 100 mil judeus no Brasil. Esta também é a minha avaliação. Também sabemos que metade dos judeus brasileiros vive em São Paulo.
Hebraica – Qual a tendência demográfica dos judeus brasileiros?
Dellapergola – Como quase todas as comunidades judaicas da Diáspora, o número de nascimentos entre os judeus brasileiros é bastante baixo. Mais pessoas morrem na comunidade do que nascem. Também, como o Brasil tem uma tradição multicultural, há muitos casamentos mistos e bastante assimilação. O número de judeus brasileiros tende a diminuir, mas não é algo dramático. Podemos até considerar a população judaica do Brasil estável, se compararmos com outras comunidades do mundo.
Hebraica – Existe um dito bastante difundido entre os judeus que diz: "Os casamentos mistos e a assimilação estão fazendo o que Hitler não conseguiu".
Dellapergola – Não gosto do estilo desta afirmação. É preciso separar demografia de um lado e Holocausto do outro. Hitler não tem nada a ver com casamentos mistos. No entanto, é fato que na maior parte das comunidades da Diáspora, somente uma pequena parcela dos filhos de casamentos mistos acaba afiliada ao judaísmo. A maioria termina por aderir à religião da maioria do país.
Hebraica – Também há vozes, especialmente nos Estados Unidos, defendendo um maior relaxamento das leis de conversão para aumentar o número de judeus. Isto poderia ser uma solução?
Dellapergola – Segundo algumas pesquisas, os filhos de casamentos mistos tendem a se casar com não-judeus numa proporção ainda maior que a média da comunidade. Isto acontece também com crianças produtos desses casamentos e que foram criadas como judias. Isto mostra que elas não são suficientemente motivadas, não recebem o conhecimento necessário sobre o que significa pertencer a uma comunidade judaica. Uma conclusão disto tudo é que um rito de admissão ao judaísmo que seja brando e não tenha um mínimo de requisitos, só terá um forte impacto a curto prazo. As comunidades judaicas receberão novas pessoas, mas elas também tenderão a sair bastante rápido. Abaixar as exigências não garantirá a expansão da comunidade a longo prazo.
Hebraica – A Bíblia diz que somos, numericamente, o menor de todos os povos. Continuaremos sendo assim no futuro?
Dellapergola – A Bíblia também ordena que nos multipliquemos e diz que um dia seremos tantos quanto o pó da terra. Assim, nosso nível populacional está condicionado ao nosso comportamento. Segundo a Torá, se nos comportarmos devidamente, seremos numerosos. Do contrário, perderemos tudo. Isto é o que está escrito.
A demografia política:
O que acontecerá quando a população árabe ultrapassar o número de judeus entre o Jordão e o Mediterrâneo, daqui a dez anos? Leia algumas opiniões:
"Nós não temos tempo ilimitado. Mais e mais palestinos estão ficando desinteressados numa solução negociada para se chegar a dois Estados. Porque eles querem transformar a essência do conflito num modelo sul-africano [apartheid]. De uma luta contra a ‘ocupação’ querem mudar para uma luta por ‘um homem um voto’. Esta será uma luta muito mais limpa e, no final das contas, também mais poderosa. Para nós, significará o fim do Estado judeu."Ehud Olmert, ministro da Indústria, do Trabalho e das Comunicações do governo do Likud
"O que realmente me dá medo é o dia, não muito distante, em que nascerá o bebê palestino que transformará os judeus deste lugar numa minoria. Então o que faremos? Como serão as coisas quando não tivermos mais a desculpa e a força de sermos a maioria? Acho que toda geração tem uma verdade, e a verdade da nossa geração é que entre o Jordão e o Mediterrâneo os judeus se tornarão minoria."Avraham Burg, um dos líderes do Partido Trabalhista
"Quanto mais rápido chegarmos a uma situação em que houver dois Estados com fronteiras razoáveis, com acordos de segurança razoáveis e com um relacionamento razoável, melhor será para resolver a questão demográfica. Isto ajudará pelo menos a reduzir a ameaça do conflito se tornar existencial para os dois povos."Dan Kurtzer, embaixador (judeu) dos EUA em Israel
OS JUDEUS E NÚMEROS:
Hoje somos quase 13 milhões.
De cada 480 seres humanos na Terra, 1 é judeu.
Os EUA têm a maior comunidade judaica (5,3 milhões),
seguidos de Israel (5 milhões) e da França (500 mil).
No Brasil vivem pouco menos de 100 mil judeus.
Hoje, os judeus representam 81% da população de Israel dentro da Linha Verde, mas em 2050 esta porcentagem cairá para 74%.
Atualmente cerca de 760 mil israelenses vivem fora do país.
A comunidade judaica da Rússia tem a maior porcentagem de casamentos mistos (78%), comparada com os judeus dos EUA (51%) e da França (40%).
Fonte: Sergio Dellapergola; jornal Haaretz
* Matéria Extraída da Revista "A HEBRAICA"
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Curiosidades,
Entrevista
PERÍODO PÓS-HOLANDÊS DISPERSÃO E ACOMODAÇÃO (1654 - 1700)
O grande êxodo:
Com a queda de Recife e subseqüente capitulação dos holandeses, entrou em plena desagregação a comunidade israelita no nordeste do Brasil.
Viram-se então os judeus dessa região, após vários anos de privações e sofrimentos, em face de uma dolorosa encruzilhada: permanecer no Brasil, onde presenciaram a calamitosa destruição da sua vida coletiva e dos seus bens pessoais, e onde os ameaçavam os horrores de uma implacável perseguição - não obstante o arranjo feito pelos holandeses com os portugueses no sentido de ficarem impunes os judeus remanescentes - ou emigrar em busca de refúgio, onde pudessem reconstruir as suas vidas.
Uma pequena parcela resignou-se à permanência no Brasil, dispersando-se pelo seu território, enquanto o grosso optou pela emigração. Destes, um grupo - constituído provavelmente dos mais ricos e mais relacionados na Holanda, entre eles o próprio chefe da comunidade rabino Isaac Aboab da Fonseca - decidiu retornar a esse país - ilha de liberdade no vasto oceano de intolerância que então era o continente europeu - ao passo que a maioria, a parte mais pobre, preferiu enfrentar o desconhecido, aventurando-se em direção das mais longínquas paragens das três Américas.
Os que regressaram à Holanda, ali se reintegraram na comunidade israelita, sem deixarem maiores vestígios. Os outros, pulverizados entre diversas colônias francesas, inglesas e holandesas das Américas, lançaram nas novas pátrias a afirmação pujante da sua vitalidade, contribuindo eficazmente para o desenvolvimento econômico das mesmas e implantando aglomerações judaicas, uma das quais viria a ser nos tempos modernos a extraordinária comunidade israelita dos Estados Unidos da América do Norte.
O destino dos fugitivos nas colônias americanas:
O êxodo dos judeus brasileiros para as colônias européias nas Américas tomou três rumos: Guianas, Antilhas e Nova Holanda (América do Norte), dos quais o segundo foi que atraiu a maioria.
Guianas. - De começo, um grupo de judeus fugitivos, sob a direção de David Nassib, fixou-se em Caiena (1657), donde, por ter sido hostilizado pelos habitantes locais, passou mais tarde para Surinam, que naquele tempo era uma colônia inglesa, somente vindo a ser conquistada em 1667 pelos holandeses.
Em Surinam, os judeus contribuíram substancialmente para o desenvolvimento da colônia, à base da cultura da cana de açúcar, e, graças à absoluta liberdade de que gozavam, foram crescendo em número e se organizando em uma comunidade duradoura que, em fins do século XVIII, chegou a contar mais de 1.300 almas. O núcleo mais importante - com 1.045 judeus numa população de 2.000 - ficava nos arredores de Paramaribo e era conhecido como "Savana Judea".
Antilhas. - A primeira leva de judeus procurou atingir a Martinica, que gozava da fama de ser bem administrada pelo governador Parquet. Este, entretanto, embora a princípio disposto a aceitá-los, resolveu, por influência dos jesuítas, não permitir o desembarque, o que fez com que os forasteiros, em número de 900, seguissem para Guadalupe, onde foram acolhidos e, bem depressa, prosperaram.
Mais tarde, Parquet, arrependido, permitiu que outras levas de judeus se estabelecessem na ilha, a qual passou então a experimentar enorme progresso na agricultura e no comércio.
Outro grupo atingiu Barbados, onde já havia alguns cristãos-novos trazidos pelos ingleses e que, acrescidos agora dos judeus brasileiros, deram um forte incremento à indústria do açúcar.
Finalmente, vários outros grupos estabeleceram-se em Jamaica e São Domingos, dedicando-se, como sempre, à sua tradicional ocupação - indústria açucareira.
Graças a esse concurso dos judeus foragidos do Brasil, conseguiu a América Central estabelecer o seu monopólio no mercado mundial de açúcar, monopólio esse que antes estava nas mãos do Brasil.
Forneceram, assim, aqueles judeus às colônias centro-americanas os elementos de riqueza que, por influência da desastrada política dos monarcas portugueses, o Brasil desprezara!
América do Norte. - Um grupo de judeus, numericamente pequeno, porém de importância significativa para a história dos judeus no Novo Mundo, deixou Recife, logo depois da sua queda, em direção à longínqua Nova Amsterdã (atual Nova York), então capital da Nova Holanda norte-americana.
Quando esse grupo de 23 judeus, levado pelo navio de guerra francês "St. Charles", acampou em 12 de setembro de 1654, à margem do Hudson, era sua esperança encontrar ali boa acolhida, por se tratar de uma colônia holandesa. Entretanto, o governador da colônia, Pierre Stuyvesant, autócrata e anti-semita, fanático e inflexível em matéria de religião, exigiu a retirada desses "inimigos e blasfemadores do nome de Cristo". E foi somente graças à intervenção da Companhia das Índias Ocidentais - em cujo seio acionistas judeus exerciam influência - que afinal se permitiu a permanência dos 23 judeus brasileiros na aldeia de Nova Amsterdã, com a condição de que "os pobres entre eles fossem mantidos por sua própria nação", que não exercessem cargos públicos, que não se dedicassem ao comércio a varejo, e que não fundassem congregação. Evidentemente, tais restrições passaram em breve a ser letra morta, pois, decorridos apenas dois anos, já haviam os judeus, sob a liderança de Asser Levy, conseguido adquirir um terreno para um cemitério próprio.
Pouco mais tarde, tendo os ingleses se apoderado em 1664 das colônias holandesas da América do Norte, os judeus passaram a gozar de absoluta liberdade de consciência, podendo assim consolidar a sua comunidade e disseminar-se pelo país, onde, com o correr dos séculos, viria desenvolver-se a maior das coletividades israelitas do mundo, tendo como principal centro a cidade de Nova York, justamente a antiga aldeia de Nova Amsterdã onde, em meados do século XVII, um punhado de judeus brasileiros fugitivos estabelecera a primeira aglomeração judaica da América do Norte.
A acomodação no Brasil
Como já foi mencionado, o êxodo que se verificou após a expulsão dos holandeses não abrangeu a totalidade da população judaica do nordeste do Brasil. Certo número de marranos resolveu permanecer na terra que havia aprendido a amar, confiando não só no compromisso estipulado no tratado de capitulação dos holandeses no sentido de que os judeus remanescentes não seriam molestados, como ainda no ambiente de relativa tolerância religiosa que então reinava em Portugal.
Contribuiu para tal ambiente a influência do padre jesuíta Antônio Vieira, enérgico, persistente e abnegado defensor dos judeus. O ardor com que lutou pela sua causa provinha-lhe da convicção de que os judeus não podiam ser jamais um perigo para Portugal: e de que, ao contrário, eles eram a energia vital da nação, tornando-se assim urgente chamar de volta os judeus expulsos ou foragidos com o fim de revigorar as forças empobrecidas. O mais importante dos trabalhos que escreveu em defesa dos judeus intitulava-se: "Proposta feita a el-rei D. João IV, em que se lhe representa o miserável estado do reino e a necessidade, que havia, de admitir os judeus mercadores, que andavam por diversas partes da Europa".
Graças à visão esclarecida e aos esforços do padre Antônio Vieira, fundou-se, em 8 de março de 1649, a Companhia Geral do Brasil, semelhante à Companhia anteriormente criada pelos holandeses, tendo os cristãos-novos ricos do país subscrito grande número de ações da nova sociedade. Como contrapartida, obtiveram os cristãos-novos várias concessões tais como a isenção do confisco dos seus bens e facilidades para comerciarem e se transportarem ao Brasil.
Em tais condições, compreende-se que, com a retirada dos holandeses do Brasil, e apagados os primeiros ressentimentos, pudessem os judeus remanescentes difundir-se pacificamente pelo território brasileiro, inclusive em áreas do próprio Nordeste, reduzindo ao mínimo as aparências da sua origem judaica.
É certo que, decorridos alguns anos, tendo falecido D. João IV em 1656, a Inquisição conseguiu pôr termo à tolerância anteriormente instituída para com os judeus e - sem se esquecer de vingar-se do padre Vieira - fez recrudescer as perseguições. Estas culminaram com a promulgação da lei de 9 de setembro de 1683, que determinava a expulsão dos cristãos-novos e a aplicação da pena de morte aos que voltassem ao país.
Os efeitos dessa nova onda de perseguições não alcançaram todavia de forma sensível o Brasil, tendo até contribuído para que se intensificasse a vinda dos cristãos-novos acossados em Portugal.
E, assim, pôde a população do Brasil, não somente recompor-se do tremendo abalo sofrido com a desagregação pós-holandesa, mas ainda experimentar um razoável crescimento numérico.
Do exposto, cabe concluir, portanto, que a segunda metade do século XVII foi um período de lenta e discreta acomodação dos judeus no Brasil: um período certamente sem brilho e sem quaisquer manifestações de vida coletiva judaica, mas também sem grandes abalos, sofrimentos e disabores.
Com a queda de Recife e subseqüente capitulação dos holandeses, entrou em plena desagregação a comunidade israelita no nordeste do Brasil.
Viram-se então os judeus dessa região, após vários anos de privações e sofrimentos, em face de uma dolorosa encruzilhada: permanecer no Brasil, onde presenciaram a calamitosa destruição da sua vida coletiva e dos seus bens pessoais, e onde os ameaçavam os horrores de uma implacável perseguição - não obstante o arranjo feito pelos holandeses com os portugueses no sentido de ficarem impunes os judeus remanescentes - ou emigrar em busca de refúgio, onde pudessem reconstruir as suas vidas.
Uma pequena parcela resignou-se à permanência no Brasil, dispersando-se pelo seu território, enquanto o grosso optou pela emigração. Destes, um grupo - constituído provavelmente dos mais ricos e mais relacionados na Holanda, entre eles o próprio chefe da comunidade rabino Isaac Aboab da Fonseca - decidiu retornar a esse país - ilha de liberdade no vasto oceano de intolerância que então era o continente europeu - ao passo que a maioria, a parte mais pobre, preferiu enfrentar o desconhecido, aventurando-se em direção das mais longínquas paragens das três Américas.
Os que regressaram à Holanda, ali se reintegraram na comunidade israelita, sem deixarem maiores vestígios. Os outros, pulverizados entre diversas colônias francesas, inglesas e holandesas das Américas, lançaram nas novas pátrias a afirmação pujante da sua vitalidade, contribuindo eficazmente para o desenvolvimento econômico das mesmas e implantando aglomerações judaicas, uma das quais viria a ser nos tempos modernos a extraordinária comunidade israelita dos Estados Unidos da América do Norte.
O destino dos fugitivos nas colônias americanas:
O êxodo dos judeus brasileiros para as colônias européias nas Américas tomou três rumos: Guianas, Antilhas e Nova Holanda (América do Norte), dos quais o segundo foi que atraiu a maioria.
Guianas. - De começo, um grupo de judeus fugitivos, sob a direção de David Nassib, fixou-se em Caiena (1657), donde, por ter sido hostilizado pelos habitantes locais, passou mais tarde para Surinam, que naquele tempo era uma colônia inglesa, somente vindo a ser conquistada em 1667 pelos holandeses.
Em Surinam, os judeus contribuíram substancialmente para o desenvolvimento da colônia, à base da cultura da cana de açúcar, e, graças à absoluta liberdade de que gozavam, foram crescendo em número e se organizando em uma comunidade duradoura que, em fins do século XVIII, chegou a contar mais de 1.300 almas. O núcleo mais importante - com 1.045 judeus numa população de 2.000 - ficava nos arredores de Paramaribo e era conhecido como "Savana Judea".
Antilhas. - A primeira leva de judeus procurou atingir a Martinica, que gozava da fama de ser bem administrada pelo governador Parquet. Este, entretanto, embora a princípio disposto a aceitá-los, resolveu, por influência dos jesuítas, não permitir o desembarque, o que fez com que os forasteiros, em número de 900, seguissem para Guadalupe, onde foram acolhidos e, bem depressa, prosperaram.
Mais tarde, Parquet, arrependido, permitiu que outras levas de judeus se estabelecessem na ilha, a qual passou então a experimentar enorme progresso na agricultura e no comércio.
Outro grupo atingiu Barbados, onde já havia alguns cristãos-novos trazidos pelos ingleses e que, acrescidos agora dos judeus brasileiros, deram um forte incremento à indústria do açúcar.
Finalmente, vários outros grupos estabeleceram-se em Jamaica e São Domingos, dedicando-se, como sempre, à sua tradicional ocupação - indústria açucareira.
Graças a esse concurso dos judeus foragidos do Brasil, conseguiu a América Central estabelecer o seu monopólio no mercado mundial de açúcar, monopólio esse que antes estava nas mãos do Brasil.
Forneceram, assim, aqueles judeus às colônias centro-americanas os elementos de riqueza que, por influência da desastrada política dos monarcas portugueses, o Brasil desprezara!
América do Norte. - Um grupo de judeus, numericamente pequeno, porém de importância significativa para a história dos judeus no Novo Mundo, deixou Recife, logo depois da sua queda, em direção à longínqua Nova Amsterdã (atual Nova York), então capital da Nova Holanda norte-americana.
Quando esse grupo de 23 judeus, levado pelo navio de guerra francês "St. Charles", acampou em 12 de setembro de 1654, à margem do Hudson, era sua esperança encontrar ali boa acolhida, por se tratar de uma colônia holandesa. Entretanto, o governador da colônia, Pierre Stuyvesant, autócrata e anti-semita, fanático e inflexível em matéria de religião, exigiu a retirada desses "inimigos e blasfemadores do nome de Cristo". E foi somente graças à intervenção da Companhia das Índias Ocidentais - em cujo seio acionistas judeus exerciam influência - que afinal se permitiu a permanência dos 23 judeus brasileiros na aldeia de Nova Amsterdã, com a condição de que "os pobres entre eles fossem mantidos por sua própria nação", que não exercessem cargos públicos, que não se dedicassem ao comércio a varejo, e que não fundassem congregação. Evidentemente, tais restrições passaram em breve a ser letra morta, pois, decorridos apenas dois anos, já haviam os judeus, sob a liderança de Asser Levy, conseguido adquirir um terreno para um cemitério próprio.
Pouco mais tarde, tendo os ingleses se apoderado em 1664 das colônias holandesas da América do Norte, os judeus passaram a gozar de absoluta liberdade de consciência, podendo assim consolidar a sua comunidade e disseminar-se pelo país, onde, com o correr dos séculos, viria desenvolver-se a maior das coletividades israelitas do mundo, tendo como principal centro a cidade de Nova York, justamente a antiga aldeia de Nova Amsterdã onde, em meados do século XVII, um punhado de judeus brasileiros fugitivos estabelecera a primeira aglomeração judaica da América do Norte.
A acomodação no Brasil
Como já foi mencionado, o êxodo que se verificou após a expulsão dos holandeses não abrangeu a totalidade da população judaica do nordeste do Brasil. Certo número de marranos resolveu permanecer na terra que havia aprendido a amar, confiando não só no compromisso estipulado no tratado de capitulação dos holandeses no sentido de que os judeus remanescentes não seriam molestados, como ainda no ambiente de relativa tolerância religiosa que então reinava em Portugal.
Contribuiu para tal ambiente a influência do padre jesuíta Antônio Vieira, enérgico, persistente e abnegado defensor dos judeus. O ardor com que lutou pela sua causa provinha-lhe da convicção de que os judeus não podiam ser jamais um perigo para Portugal: e de que, ao contrário, eles eram a energia vital da nação, tornando-se assim urgente chamar de volta os judeus expulsos ou foragidos com o fim de revigorar as forças empobrecidas. O mais importante dos trabalhos que escreveu em defesa dos judeus intitulava-se: "Proposta feita a el-rei D. João IV, em que se lhe representa o miserável estado do reino e a necessidade, que havia, de admitir os judeus mercadores, que andavam por diversas partes da Europa".
Graças à visão esclarecida e aos esforços do padre Antônio Vieira, fundou-se, em 8 de março de 1649, a Companhia Geral do Brasil, semelhante à Companhia anteriormente criada pelos holandeses, tendo os cristãos-novos ricos do país subscrito grande número de ações da nova sociedade. Como contrapartida, obtiveram os cristãos-novos várias concessões tais como a isenção do confisco dos seus bens e facilidades para comerciarem e se transportarem ao Brasil.
Em tais condições, compreende-se que, com a retirada dos holandeses do Brasil, e apagados os primeiros ressentimentos, pudessem os judeus remanescentes difundir-se pacificamente pelo território brasileiro, inclusive em áreas do próprio Nordeste, reduzindo ao mínimo as aparências da sua origem judaica.
É certo que, decorridos alguns anos, tendo falecido D. João IV em 1656, a Inquisição conseguiu pôr termo à tolerância anteriormente instituída para com os judeus e - sem se esquecer de vingar-se do padre Vieira - fez recrudescer as perseguições. Estas culminaram com a promulgação da lei de 9 de setembro de 1683, que determinava a expulsão dos cristãos-novos e a aplicação da pena de morte aos que voltassem ao país.
Os efeitos dessa nova onda de perseguições não alcançaram todavia de forma sensível o Brasil, tendo até contribuído para que se intensificasse a vinda dos cristãos-novos acossados em Portugal.
E, assim, pôde a população do Brasil, não somente recompor-se do tremendo abalo sofrido com a desagregação pós-holandesa, mas ainda experimentar um razoável crescimento numérico.
Do exposto, cabe concluir, portanto, que a segunda metade do século XVII foi um período de lenta e discreta acomodação dos judeus no Brasil: um período certamente sem brilho e sem quaisquer manifestações de vida coletiva judaica, mas também sem grandes abalos, sofrimentos e disabores.
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